Roberta Manreza Publicado em 15/10/2016, às 00h00 - Atualizado em 17/10/2016, às 09h29
Por Tiago Tamborini*, psicólogo
Seu filho já tentou te aterrorizar com a ideia de que ao fazer 18 anos ele irá ganhar o mundo e começar a fazer tudo que, hoje, você o impede de fazer? Essa é uma “ameaça” comum feita por adolescentes, mas até mesmo os pais de crianças mais jovens já ouviram isso. Crianças e adolescentes adoram flertar com a possibilidade da liberdade absoluta. Imaginar que aos 18 anos poderão ganhar o mundo e fazer o que quiserem é muito prazeroso. Mas você não precisa ficar angustiado com isso. Entendo que seu filho está te dando a oportunidade de explicar para ele a diferença entre liberdade e autonomia.
Sim, esses dois conceitos caminham juntos, mas não são sinônimos como muitos jovens acreditam que seja. Liberdade é algo que conquistamos naturalmente com a idade; ao crescermos ganhamos a liberdade de dirigir, viajar sozinho para outros estados, frequentar motéis e até mesmo consumir bebida alcoólica, não é mesmo? No entanto a autonomia para que isso possa acontecer precisa ser conquistada. A história do Brasil nos dá um importante exemplo do que estou querendo dizer.
Em 1888, a lei Áurea concedeu aos escravos brasileiros a liberdade de não trabalharem mais em regime de escravatura. Livres e podendo decidir para quem trabalhar, ganharam esse direito. O problema é que não tinham autonomia, pois inicialmente não existia um mercado de trabalho que acolhesse todos aqueles homens e mulheres que, agora, eram livres. Sem oportunidades de emprego e com pouquíssima perspectiva de conquista da independência, muitos voltavam a trabalhar em troca de comida e moradia, algo muito parecido com a escravidão.
Perceba que, nesse exemplo histórico, ter liberdade não significou poder fazer tudo o que se queria. Sem autonomia, pouca coisa mudou no primeiro momento. Entendo que, para tudo em nossas vidas, conhecer essa sutil e importante diferença é fundamental para o nosso sucesso e felicidade. Seu filho está dizendo que ao ganhar liberdade poderá fazer tudo? Ótimo, isso é sinal de saúde emocional. Gosto de conhecer crianças e adolescentes ansiosos por tomarem as rédeas de suas vidas nas próprias mãos. Jovens dispostos a ganhar o mundo e terem suas próprias escolhas, desenvolvendo suas próprias identidades. No entanto é importante que ensinemos a eles a diferença entre ganhar liberdade e conquistar autonomia.
Com 18 anos eles podem dirigir, mas que carro? Nessa idade já podem viajar sozinhos, mas com que dinheiro? Deixe claro para seu filho que a maioridade dará de presente uma série de possibilidades, mas, para usá-las, precisará investir em conhecimento, trabalhar e assumir responsabilidades. A boa notícia? Isso também é legal. Tão gostoso quanto ganhar liberdade é poder conquistar a autonomia, e quanto antes nos damos conta disso, mais chances temos de sermos felizes e bem sucedidos.
Nesse momento você pode estar se perguntando: como ajudo meu filho nesse processo? Só falar já basta? Não, não é apenas dialogando que ensinamos às crianças e adolescentes essas diferenças. A forma que educamos é determinante para que eles possam entender isso. Para saber se está no caminho certo avalie como estão os acordos estabelecidos entre vocês. Por exemplo, quando ele consegue algo que queria, isso é um ganho ou uma conquista? Se ele conquistou, seu esforço pessoal contribuiu para isso. Caso contrário ele ganhou. Só não vale considerar a insistência como o esforço pessoal. Pedir algo diariamente para os pais é bem diferente de batalhar pela conquista desejada. Se ele quer um celular, o esforço pessoal está em guardar dinheiro da mesada ou trabalhar. Se for uma viagem com os amigos, é pesquisar o melhor preço de passagem, ajudar os pais na economia doméstica ou algo parecido. Se a vontade for de ir para uma festa com os amigos, o caminho é mostrar maturidade suficiente, cumprindo com os combinados de horário nas saídas anteriores e assim por diante.
Sendo assim, ao ouvir seu filho dizendo que aos 18 anos ele irá ganhar o mundo e fazer tudo o que deseja, estimule essa ideia, não tenha medo. Basta incluir o conceito de conquista da autonomia e pronto, só coisas boas virão disso. Mesmo porque, se ele não conquistar a autonomia, nada mudará com a chegada aos 18 anos!
*Tiago Tamborini é psicólogo e sócio-diretor na empresa Asatempo – Psicologia e Consultoria LTDA. Participou como especialista convidado do Papo de Mãe sobre “Liberdade Vigiada” e do papo com “Adolescentes”.
Assista ao Papo de Mãe sobre os 18 anos dos filhos e ao Papo de Mãe com Adolescentes: