“Como você é preguiçoso!”. “Você é muito chato”. “Deixa de ser mimado”. “Mas é muito desastrado mesmo”. Frases do dia a dia, ditas muitas vezes por espontaneidade e no calor do momento, podem causar um impacto sem tamanho no desenvolvimento da autoestima e da autoconfiança das crianças.
Roberta Manreza Publicado em 08/01/2018, às 00h00 - Atualizado às 12h34
Por Jozimeire Stocco, doutora em educação
Cada palavra dita por um adulto a uma criança mostra a ela como são vistas no núcleo familiar e interfere no desenvolvimento da autoestima e da autoconfiança
“Como você é preguiçoso!”. “Você é muito chato”. “Deixa de ser mimado”. “Mas é muito desastrado mesmo”. Frases do dia a dia, ditas muitas vezes por espontaneidade e no calor do momento, podem causar um impacto sem tamanho no desenvolvimento da autoestima e da autoconfiança das crianças.
O fato é que cada criança lida de uma maneira com elogios ou críticas. Enquanto algumas preferem mostrar a todo o momento o quanto são capazes, outras podem tomar para si o adjetivo utilizado e concretizá-lo: “Se é isso que pensam de mim, é assim que vou ser”.
Dependendo da forma como um adulto se manifesta, a criança pode deixar de acreditar nela mesma. “Imagine só o que pode acontecer na cabecinha de uma criança: se você, que é adulto e que é uma referência para mim, não acredita no meu potencial, por que eu acreditaria?”, diz Jozimeire Stocco, diretora-geral do Colégio Stocco e doutora em educação. Essa pode ser uma das formas que os pequenos lidam internamente com isso, no sentido de serem incapazes de superarem suas dificuldades, uma vez que quem está no seu entorno não acredita ou não mostra que eles realmente possam.
Para Jozimeire, o ideal é substituir esses tipos de expressões por adjetivos que mostrem para a criança que ela não agiu adequadamente, mas sem o tom pejorativo, com comparações a animais ou com adjetivos que podem levá-la a pensar que não está agradando ou que não é querida ou amada no universo familiar ou social a qual faz parte. “Ao invés de ‘você é chato’ diga apenas ‘você agiu de maneira inadequada, não gostei do que você fez’. Em vez de ‘você não consegue’, é possível dizer ‘você não conseguiu dessa vez, mas eu sei o quanto você é competente. Vai dar certo’’, sugere ela.
A partir do momento em que a criança se sente amada e respeitada no núcleo mais importante que é o núcleo familiar ela pode se conduzir num contexto social mais amplo de maneira sadia e confiante, e diante de desafios ou situações que não lhe são favoráveis.
As crianças precisam ser chamadas a atenção para que percebam quando não acertaram, quando desrespeitaram regras, não cumpriram o que é combinado ou estabelecido pela família, pela escola ou pelo grupo as quais participam. Adjetivos que limitam e inferiorizam apenas prejudicam a criança para que ela tenha uma baixa autoestima. Se há baixa autoestima, a criança não acredita que ela pode. Se ela não acredita que ela pode, ela não se desenvolve como poderia.
O mesmo acontece com as rotulações que levam em conta o gênero. É muito comum meninas serem mais elogiadas pela aparência, com termos como linda e princesa. Já os meninos, por sua vez, pela força, coragem e inteligência. “Tanto meninas quanto meninos podem ser lindos, corajosos e inteligentes. É oportuno repensarmos a maneira como nós, adultos, fazemos elogios às crianças. O que deve prevalecer é o contexto dos elogios, e o fato de que estamos formando uma personalidade”, comenta a educadora.
A autoestima e a autoconfiança são construídas por elogios reais e verdadeiros. Além de serem combinações de sentimentos como se sentir amado, se sentir capaz, de saber que é possível enfrentar, sonhar, conquistar. Críticas devem ser feitas desde que contribuam para o desenvolvimento sadio da personalidade e do caráter, e, sobretudo, que ela perceba que é amada e respeitada em sua individualidade. “Precisa haver sempre um equilíbrio entre limite, disciplina e amor, esse é o segredo. Lembrar, que um dia já fomos crianças e que somos aquilo que os adultos com os quais nós convivemos fizeram de nós, pode fazer toda a diferença”, fala Jozimeire.
*Jozimeire StoccoJozimeire Stocco é diretora geral do Colégio Stocco, um dos mais tradicionais do ABC Paulista, desde 1954. É pós-doutoranda em Educação pela PUC-SP; doutora e mestra em Educação; especialista em Educação Infantil; e bacharel em Direito. Integra o Banco de Especialistas em Direito Educacional da ABRADE (Associação Brasileira de Direito Educacional).