Roberta Manreza Publicado em 23/12/2017, às 00h00 - Atualizado às 13h58
Dezembro é mês de “respirar” Papai Noel. Embora sua imagem esteja atrelada a mais importante celebração cristã e a data comemorativa de maior movimentação no mercado mundial de consumo, Papai Noel carrega uma universalidade encantadora: bondade, solidariedade, sentido de justiça, sabedoria dos mais velhos e a capacidade genuína de ouvir o desejo do outro.
Papai Noel escuta, mas também cobra. Com colo macio e barba de algodão doce, pergunta para cada criança que chega tímida ou totalmente à vontade, se estudou o ano todo, obedeceu à mamãe e ao papai, foi um menino ou menina legal. Suas perguntas não são um julgamento moral (como muitos adultos fazem), mas uma maneira de lembrar que o respeito está acima do desejo e que a recompensa deve acontecer por mérito. Papai Noel é pai, a voz da autoridade que sopra nos ouvidos lembrando que o sonho é ilimitado, mas a vida não.
Permitir a criança acreditar nesta figura não é incentivar o consumismo ou ser cúmplice de uma “mentira”, mas é autorizá-la a imaginar, sonhar e pensar. Através do mundo de fantasia a criança questiona “verdades” inerentes ao mito e à realidade – “Como o Papai Noel consegue carregar tantos presentes?” / “Como o Papai Noel entra em casa se não tem chaminé?” / “Existe mais de um Papai Noel?” / “Papai Noel usa aquela roupa todos os dias?” / “A barba do Papai Noel é dele?”. Indagações desta natureza acontecem quando a criança começa a desconfiar sobre a existência real do bom velhinho, podendo levar alguns Natais até que ela descubra sua “verdadeira história” (em geral entre os 6-7 anos).
Se até os 9-10 anos a criança ainda acreditar que Papai Noel é real, deve-se avaliar se ela está tendo a chance de entrar em contato com o mundo de faz de conta (livros, filmes, brincadeiras) ou com a realidade. Muitas vezes, Papai Noel e outras figuras continuam reais como alternativa de manter vivo um pedacinho do mundo da imaginação que não conseguiu ser preenchido com outros recursos criativos, ou como fruto da prioridade que se dá à fantasia em detrimento da realidade, pelas mais diversas razões (não querer que a criança cresça, querer que ela acredite naquilo que se acreditou ou não, entre outras). Por isto, o mais importante para a criança é poder transitar entre o mundo de fantasia e o real, sem priorizar um ao outro.
Quando irmãos, primos e amigos mais velhos tentam dizer aos menores que Papai Noel não existe, isto não deve ser motivo de preocupação. A criança só vai aceitar a realidade quando ela se questionar a este respeito. De qualquer modo, se a provocação inquieta todos, vale ter uma conversa em separado com quem a incita, lembrando-lhe como foi acreditar e depois descobrir a “verdade” sobre Papai Noel e outros personagens de faz de conta.
O mais importante no percurso indagatório da criança é não deixá-la sem resposta. Como quase todas suas perguntas são formuladas com base em hipóteses investigativas, não podemos desperdiçar este campo fértil respondendo-a prontamente. Ao invés de servi-la com uma resposta fechada, pergunte-lhe o que ela imagina que é, acontece, significa. Desta maneira, estimulamos sua capacidade de construir pensamento, facilitando, assim, a ponte entre o mundo imaginário e a realidade.
Se, mais cedo ou mais tarde, todos nós conhecemos “a verdadeira história de Papai Noel”, por que crianças de todas as idades não perdem o encanto pelo bom velhinho?
Voltemos ao início. A magia de Papai Noel está na possibilidade sem fim de sonhar, imaginar, criar; está no desejo de ser olhado, acolhido e escutado, não como mais um, mas como único. Papai Noel personifica nossos anseios sem deixar de traçar limites. Em cada um de nós, ele silenciosamente mobiliza o que temos e o que procuramos. É por isto que ele encanta e continua existindo de uma forma muito particular para cada criança e adulto.
Diante de tantas injustiças e desrespeitos, é essencial existir alguém que “não se esquece de ninguém” e nos faz lembrar que em cada um de nós reside traços de bondade, solidariedade e justiça, que, se adormecidos, costumam acordar na época do Natal.
Pena que Natal não é todo dia. Por isto mesmo, deixe sua criança “acreditar” em Papai Noel! Com seus gestos brandos e poucas palavras, ele nos ensina muito mais do que Jingle Bells, no Natal ou sempre que ele se faz presente em nossas vidas.
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