À espera do pelo preto. A leveza e o bom humor podem tornar a puberdade menos penosa

Roberta Manreza Publicado em 30/09/2016, às 00h00 - Atualizado às 07h14

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30 de setembro de 2016


Por José Ruy Gandra*

Prestes a completar sua primeira dúzia de anos, Pedro ensaiava sua entrada num território que lhe era desconhecido: a puberdade. A questão veio à tona na sua escola que, com lições e metáforas, tentava preparar os alunos para essa passagem.

Não é fácil. Meu garoto andava ansioso com as transformações que, silenciosamente, os hormônios vinham impondo à sua turma. Tímido, não escondia certo inconformismo com o súbito e crescente interesse demonstrado por seus chapas pelas meninas do círculo. Por que razão, ele parecia perguntar-se, as inocentes festinhas de aniversário agora se chamam “baladas”? Enquanto outros colegas já dançavam, às vezes de rosto colado, ele e alguns amigos, cada vez mais raros, ainda preferiam jogar bola ou correr pelos playgrounds.

Procuramos fazer com que ele encarasse o fenômeno por um prisma bem-humorado. “Você está na fila de espera”, disse a ele outro dia. “Espera de quê?”, ele devolveu. “Do primeiro pelo preto”, expliquei-lhe. “Um dia”, prossegui, “você descobrirá em alguma parte de seu corpo, geralmente na virilha ou nas axilas, que ele nasceu. Um longo, solitário e desconcertante pelo escuro que, nos meses seguintes, ganhará muitos outros companheirinhos”.

Sua reação não foi das mais animadas. Era como se eu lhe dissesse que, de uma hora para outra, uma enorme verruga brotaria na ponta de seu nariz. Pedro sentia-se desconfortável. Se tivesse podido escolher, provavelmente ele teria preferido permanecer com sua penugem rala e clarinha.

A puberdade é uma transição penosa. Poucas coisas nessa idade são tão difíceis quanto constatar que os amigões começam a revelar mais interesse pelas meninas que por seus velhos chapas. Beira a traição. Pra que chacoalhar-se ridiculamente numa pista de dança, diante de uma garotinha eufórica se podemos nos divertir com uma disputa para ver quem come mais cachorros-quentes ou entorna mais latinhas de guaraná?

Mesmo sem proferir uma única palavra, Pedro o tempo todo parecia perguntar: “Pra que crescer, afinal, se tudo parece tão bem como está?”. Nossa resposta é uma só: “Porque a vida é assim, filho”. As coisas mudam. Todos mudamos. Mesmo que, conscientemente, não o desejemos. “O importante”, insistia,“é deixar que essas mudanças rolem sem resistir demais a elas”.

Pedro pagava, geralmente com vergonha, o preço dessas transformações. Ele praticava natação numa academia. Uma de suas colegas de escola fazia a aula imediatamente seguinte à sua. Quase sempre eles se encontravam à beira da piscina. Pedro enrubescia só de vê-la. A fim de evitá-la, saía da água voando para o vestiário. Um dia, porém, teve de apanhar suas roupas numa cadeira ao lado da amiga. No afã de escapar rapidamente, acabou derrubando a cueca bem diante dos olhos da menina. Ela riu. Pedro quase desmaiou de vergonha.

Repeti-lhe, então, que isso logo passará. “Quando, pai?” Resposta: “Assim que o primeiro pelão preto nascer”. Pedro ainda o aguardou por dois anos. Mas demos uma festa quando ele chegou.

*José Ruy Gandra, jornalista e palestrante, é autor do livro Coração de Pai – Histórias sobre a arte de criar filhos. Bem mais que isso, é pai de Paulo (in memoriam) e de Pedro e avô de Rodrigo (5 anos).  Participou dos programas “Papo de Pai” e “Sogras”. Contato: jr.gandra@uol.com.br . 

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