Finados. Precisamos falar sobre a morte

Roberta Manreza Publicado em 02/11/2016, às 00h00 - Atualizado às 09h47

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2 de novembro de 2016


Por Aurélio Melo*, psicólogo

A morte ganha um dia próprio no calendário de muitas culturas e tem diversas interpretações. Você sabe quais são seus significados? De onde vem o medo da morte? Quais as concepções da morte na modernidade? O psicólogo da Universidade Presbiteriana Mackenzie e especialista no assunto, Aurélio Melo, comenta os principais tópicos que cercam o tema.

O que é a morte?

A morte é, ao mesmo tempo, necessária e impossível ao pensamento. É o que diz o filósofo francês Comte-Sponville. Isso significa dizer que não ficamos sem pensar na morte, logo ela é necessária. Mas não temos a experiência da morte (ninguém nunca voltou dela), logo ela é impossível conhecê-la.

Porque temos medo da morte?

Todos temos medo da morte: as crianças, os velhos, os ateus, os religiosos, os corajosos e os covardes. São muitos os tipos de medo: medo do fim, medo de sofrer, medo do desconhecido, medo da separação e do abandono.

Nascemos com medo da morte?

Não. Quando criança pequena, nos primeiros anos de vida, sequer distinguimos seres animados de inanimados. Portanto, não se sabe o que é morrer.  A ideia da morte vai sendo conhecida paulatinamente e é por volta do início da adolescência que se tem a ideia da morte como evento natural, universal e irreversível.

O homem sempre temeu a morte?

Não. A morte foi encarada de diferentes maneiras pelo homem, de acordo com cada época e cultura. Por exemplo, no século XIX, no ocidente marcado pelo romantismo, a morte era, de certa maneira desejada pelos jovens. Era glamoroso morrer jovem e apaixonado. Já nos dias atuais, “afastamos” a morte da nossa vida e, quando ela aparece, lamentamos como se fosse uma falha tecnológica, um acontecimento que poderia ter sido evitado se a medicina fosse mais avançada.

Existe morte em vida?

Sim. Há a morte das pessoas próximas, queridas ou conhecidas (as celebridades) que nos traz uma experiência de separação, perda, dor. É a morte do outro. Há também mortes simbólicas pelas quais passamos ao longo da vida: a aposentadoria (morte profissional); a velhice (morte social); a menopausa (morte da fertilidade); a separação conjugal (morte do outro dentro de mim).

O que é a morte hoje?

A morte hoje vem sendo expropriada. Ou seja, vem sendo expulsa do seu lugar. Não se fala em morte, nem na morte. Em poucos dias, a morte cai no esquecimento. Os rituais funerários são cada vez mais rápidos e esvaziados de carga dramática. A morte atrapalha e, como diz o título de um belo filme: “The show must go on” (o espetáculo deve continuar).

*Aurélio Melo é professor e psicólogo da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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