A prevenção de acidentes com crianças salva vidas. A negligência pode matar ou deixar sequelas
Erika Tonelli* Publicado em 13/06/2022, às 08h33
No último sábado tivemos novamente a triste notícia do falecimento de mais uma criança de 6 anos, vítima de um acidente, não haver tela de segurança na varanda do apartamento em que se encontrava e com o agravante de ter sido deixada sozinha.
Não faz muito tempo que tratei sobre isso no artigo "Precisamos falar de prevenção: não deixem crianças sozinhas e sem um ambiente seguro!", e dois meses depois venho mais uma vez com esse alerta. Chamaremos atenção quantas vezes for necessário até conseguirmos atingir um nível maior de conscientização da sociedade sobre a urgência de promovermos espaços seguros e protetores para crianças.
Nunca devemos deixar crianças menores de 10 anos sem supervisão de adultos responsáveis, seja em ambientes domésticos ou espaços comunitários. Acidentes não são fatalidades e podem ser evitados em 90% dos casos com medidas comprovadas de prevenção. O olhar atento e o cuidado de qualidade nos primeiros anos de vida da criança são primordiais para isso.
Atualmente não há dispositivo de Lei que regulamente ou obrigue o uso de redes de proteção em apartamentos. Mas há normalização da ABNT NBR 16046 a respeito de fabricação, cordas e instalação do sistema. E todos devem ser respeitados, pelos condôminos quanto pelos pais, sob o risco de em havendo um acidente responderem por negligência.
No caso em da menina, o pai será responsabilizado criminalmente sobre abandono de incapaz, pois deixou a filha dormindo e se ausentou para levar a namorada em casa. Mesmo que tenha sido por 30 minutos, não é caso somente de abandono de incapaz, mas sim de negligência.
No caso de abandono de incapaz se dá quando a criança é deixada sem cuidados. Uma única vez é suficiente:
“Código Penal Art. 133 - Abandonar pessoa que está sob seu cuidado, guarda, vigilância ou autoridade, e, por qualquer motivo, incapaz de defender-se dos riscos resultantes do abandono. Pena: detenção, de 6 meses a 3 anos.”
Em se tratando do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), temos:
“Art. 5º Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.”
Além disso o ECA traz a definição utilizada na prevenção e assistência à violência doméstica, em que dita que a negligência ocorre quando os pais ou cuidadores responsáveis omitem em fornecer as necessidades físicas e emocionais da criança e/ou adolescente. A negligência ocorre quando os pais ou responsáveis fracassam em alimentar, vestir de maneira adequada os filhos, medicá-los, educá-los e impedir acidentes (BRASIL, 1990).
Consensualmente, a negligência pode ser descrita quando há inaptidão parental para proporcionar cuidados de qualidade à criança, por ausência de medidas de proteção apropriados. Privar a criança de supervisão ou cuidados adequados, como no caso a instalação de uma rede de proteção na sacada do prédio e janelas também é considerado negligência.
A negligência pode ser traduzida como voluntária quando há a intenção de causar dano, ou involuntária, que é o resultado de forma geral da incompetência dos pais em garantir os cuidados necessários e adequados (*).
No caso das telas de proteção creio que passou do tempo dos alertas e informação, mas de termos uma Lei que regulamente sua utilização, com sérias punições aos pais, cuidadores e condomínios no que se refere a sua não utilização. Porque se não temos uma negligência sistêmica, por parte de toda a sociedade, para que acidentes como esses se repitam semanalmente.
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao lazer e à profissionalização, à liberdade, ao respeito, à dignidade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.” – Artigo 227 da Constituição Federal de 1988.
Em 2021, as quedas representam 44% do total das internações de crianças de 0 a 14 anos, foram registrados 110.341 casos de hospitalização devido a acidentes. E em relação aos óbitos de 2020, representam 12% do total. (Fonte: Datasus – 2020/2021/ Análise: Aldeias Infantis SOS – 2022).
Para além da gravidade de ter a vida interrompida ainda na infância, por acidentes que poderiam ser evitados, trazem um enorme impacto no sistema de saúde, financeiro, social e emocional para crianças e suas famílias.
Diante desse cenário vale sempre relembrar: instale grades ou redes de proteção nas janelas, sacadas e mezaninos!
Além de colocar em práticas dicas de proteção, a primeira delas que deve ser seguida à risca: crianças precisam sempre estar sob a supervisão de um adulto! Precisamos entender que os riscos são imensos ao deixar meninos e meninas sem o olhar atento e cuidadoso, não somente de acidentes (que podem levar ao óbito) mas estarem vulneráveis a violências e violações de direitos de todas as formas.
Para auxiliar nessa tarefa preparamos um check-list para que todos possam verificar os níveis risco que as crianças podem correr dentro de casa, pois podem ter inúmeras situações e objetos comuns do dia a dia os quais podem representar riscos para crianças se acidentarem seriamente.
A prevenção de acidentes passa por uma mudança do comportamento de adultos, cuidadores e toda a sociedade em geral de buscar intervir antes que a crianças e adolescentes tenham sua integridade colocada em risco. Isto quer dizer a construção de um olhar mais afetivo e de que a infância necessita de cuidado de qualidade em todas as etapas do desenvolvimento, para que cresçam de forma saudável e livre de traumas (físicos e psicológicos).
Para saber mais sobre prevenção de acidentes clique aqui!
(*) MAGALHÃES, T. Maus Tratos em Crianças e Jovens – Guia prático para profissionais. Saúde e Sociedade nº13. Coimbra. Quarteto. 2002.
*Erika Tonelli é Especialista em Entorno Seguros e Protetores da Aldeias Infantis SOS.
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