Mariana Kotscho Publicado em 06/11/2020, às 00h00 - Atualizado em 07/11/2020, às 13h15
Por Damaris Gomes Maranhão. Doutora em Ciências da Saúde, é professora do Instituto Vera Cruz e do Instituto Avisala
Saúde e educação integradas pelo bem das crianças: Um “papo de mãe” e de profissionais de saúde com os professores.
Pesquisas mostram que a maioria das mortes de crianças de 1 a 14 anos no Brasil é causada por acidentes. Tragédias que poderiam ser evitadas com medidas de prevenção: se todos fossem bem informados e levassem a sério as recomendações de profissionais de saúde sobre determinados riscos.
No campo das ciências da saúde o termo “risco” é resultado da ‘”taxa de incidência”. Mas o que isso quer dizer? Um índice que se obtém pelo cálculo do número de casos novos de um agravo à saúde, dividido pela população de determinada faixa etária e contexto.
Um artigo científico publicado com o estranho título “E a mãe a insistir no amendoim” alerta sobre a importância de se considerar o histórico da ocorrência anterior aos primeiros sinais e sintomas de uma aparente “doença” apresentada por uma criança, pois nem sempre a investigação clínica e radiológica comprova a presença do chamado “corpo estranho” ingerido ou aspirado por ela, dificultando o diagnóstico com consequências às vezes fatais.
“A aspiração de corpos estranhos, mais comuns nas crianças em idade pré-escolar, é um acidente que pode causar doença grave ou mesmo morte. Apresentando-se mais frequentemente por sufocação, tosse, sibilância, febre e alterações radiológicas, pode, contudo, não revelar qualquer sintoma ou sinal imagiológico, sendo a história clinica sugestiva um elemento chave no seu diagnóstico” (Granja, 2009)
A autora analisa o caso de uma criança de 20 meses, que após comer amendoins começa a apresentar tosse e sibilância (sintoma respiratório). A criança foi atendida em um serviço de emergência, mas a história materna não foi confirmada pela radiografia dos pulmões, sendo tratada como broncoespasmo clínico. Como os sintomas persistiram, a mãe retornou ao serviço, mas não confirmavam a suspeita dela. Como a criança não melhorava, no 33º dia uma broncofibroscopia evidenciou a necrose da parede do brônquio causada pela casca do amendoim que foi aspirada pela criança. Ou seja, a criança tossiu mas não se asfixiou no momento pela característica do corpo estranho, mas a casca do amendoim foi aspirada fixando-se no brônquio, o que causava os sintomas identificados pela mãe. Muitas vezes, uma criança que aspira uma partícula ou um líquido pode tossir mas não apresentar sinais de asfixia. Dias depois, iniciam os outros sintomas, nem sempre associados com a origem do problema. Pode ter febre, tosse, “falta de ar” (dispnéia) evoluindo como se fosse uma infecção pulmonar, geralmente uma complicação decorrente da aspiração da substância ou partícula (Granja, 2009).
Alguns objetos como moedas, chaves, peças de quebra-cabeças, baterias ou pilhas, tampas de canetas podem ser deglutidos e horas ou nos dias seguintes serem eliminados nas fezes. Outros podem se alojar na orofaringe causando asfixia, que requer Suporte Básico de Vida. Alguns são aspirados e podem se alojar nos brônquios como ocorreu no caso relatado com a pele do amendoim. A deglutição de brinquedos contendo imãs pode causar coalescência de órgãos, outros podem infiltrar-se na mucosa ou outras estruturas orgânicas.
Em 2012, no Kansas, EUA, os pais levaram um bebê de seis meses ao médico porque ele apresentava um inchaço no pescoço, abaixo da orelha, que os médicos trataram com antibiótico, a partir da hipótese de ser uma infecção de um nódulo do pescoço, mas sem sucesso. Em uma reavaliação, o médico, ao tentar remover o que parecia ser um cordão introjetado no tecido, retirou uma pena de ave com 6 cm. “ O hospital de Hutchinson, no Kansas (EUA) informou que Mya engoliu ou aspirou a pena, que ficou presa na garganta, fazendo com que o organismo da menina tentasse “empurrar” o corpo estranho[2]
A incidência de introjeção de objetos estranhos nos orifícios do corpo tem um pico entre um e dois anos de idade, devido a características do crescimento e desenvolvimento nessa fase associado às atitudes de observação, exploração e reconhecimento dos objetos por manipulação, às vezes tocando-os com o nariz, a boca, associado à imaturidade do sistema de mastigação, deglutição, controle muscular e da posição da laringe. A natureza desses acidentes depende dos aspectos sócio-históricos-culturais associados aos hábitos alimentares de cada região do país, ou de diferentes países, e do acesso das crianças a determinados brinquedos ou materiais.
Nos Estados Unidos, a ACE é a principal causa de morte acidental em crianças menores de seis anos, com incidência anual estimada entre 500 e 2.000 casos (Granja, 2009).
Nem sempre os adultos percebem a introdução de objetos estranhos pelas crianças nas próprias cavidades corporais ou sua aspiração. As complicações mais frequentes incluem processo inflamatório, espasmos da laringe, bronquite crônica e pneumonia. Complicações graves, como obstrução severa das vias aéreas e morte, tendem a ocorrer em crianças de pouca idade devido ao seu reduzido calibre das vias aéreas.
Os alimentos ou objetos também podem drenar para o conduto auditivo (quando o bebê toma uma mamadeira deitado, por exemplo, o leite pode fluir para o conduto auditivo que na criança é mais retificado que no adulto), ou ser inserido pela própria criança nas fossas nasais. A introdução de objetos nas fossas nasais, boca, orelha são acidentes comuns em crianças na idade de exploração de materiais e do corpo, podendo levar a aspiração ou inflamação supurativa. Uma análise de 420 casos de corpos estranhos de fossas nasais removidos no serviço de Otorrinolaringologia e Endoscopia Per-oral (ORL-EPO) do Hospital Municipal Souza Aguiar (RJ), no período de dezembro de 1992 a dezembro de 1998, foi encontrada uma maior incidência na faixa etária de 0 a 4 anos, sendo os mais comuns, pela ordem fragmentos de espuma, fragmentos de material plástico, grãos de feijão e fragmentos de papel. As complicações ocorreram em 9,05% dos casos, sendo as mais comuns o sangramento (epistaxe) e inflamação do vestíbulo (FIGUEIREDO et al, 2006).
Meu filho, hoje médico psiquiatra, quando tinha três anos estava sendo examinado pela pediatra numa consulta de rotina, quando ela visualizou algo estranho dentro de seus dois ouvidos: cuidadosamente retirou com a pinça pedacinhos de papeis pintados e dobrados. Ela perguntou quem havia colocado aquilo em sua cavidade auditiva e ele disse que era uma coleguinha. O achado foi casual, não havia queixa de parte dele, nem havia reclamado para a professora ou para a mãe, no caso eu.
Para conhecer as características clínicas, radiológicas e endoscópicas da ACE em pacientes atendidos em um serviço público de referência em São Luís (MA), realizou-se um estudo descritivo de pacientes submetidos à endoscopia respiratória por ACE, atendidos entre 1995 e 2005. Os tipos de corpo estranho mais frequentes foram sementes (46,6%), espinha de peixe (28,3%), grãos (13,3%), osso (8,3%) e carne (3,3%), enquanto, entre os inorgânicos, foram plásticos (25%), pito de bola (16,6%) e tampa de caneta (16,6%); A localização predominante do corpo estranho foi o pulmão direito, como observado em outros trabalhos.(1,7,11) No entanto, observou-se alta porcentagem de corpos estranhos localizados na laringe, cujos relatos são pouco frequentes,(17,22) quando confrontados com outras localizações.(1,7,14,26) Esse achado pode estar especificamente relacionado com a aspiração de espinha de peixe, que, pela sua característica perfurante, aloja-se frequentemente na laringe ( Souza, 2007)
A alta frequência de aspiração de sementes de frutas não difere da literatura.(1,22,26). No entanto, a aspiração de espinha de peixe difere de alguns estudos,(4,7) nos quais o amendoim é a principal substância orgânica aspirada. Tal fato pode ser devido ao hábito alimentar da população estudada, que tem no peixe, oferecido às crianças desde os primeiros anos de vida, sua base alimentar. Essa hipótese é reforçada pela procedência dos pacientes de cidades do interior (ribeirinhas e praianas), onde é frequente a cultura da pesca de subsistência. Desse modo, a idade inferior a 3 anos, a aspiração de espinha de peixe e a localização do corpo estranho na laringe estão inter-relacionados.(Souza, 2007)
Um estudo de revisão analisando 10 casos de mortes em crianças menores de 14 anos nos Estados Unidos da América, encontrou como causa mais comum a aspiração de balões de látex usados em festas de aniversário, brincadeiras ou distribuídos em lojas para crianças( Lifschultz, Donoghue,1996)
Uma análise realizada entre abril de 2013 a junho de 2018 em um hospital universitário no Japão, analisou 252 prontuários de pacientes pediátricos com diagnóstico de ingestão de corpo estranho e concluiu que o tipo de objeto varia com a idade das crianças, relacionada a curiosidade e acesso delas aos mesmos. A mediana dos pacientes foi de 15 meses e, do total de pacientes, 55,5% eram meninos. Os objetos ingeridos foram cigarros (17% com idade mediana de 11 meses); plásticos (17% idade mediana 11 meses); produtos químicos (11 % idade mediana 13 meses); medicamentos internos ( 10% idade mediana 33 meses) e metais (10 % idade mediana 35 meses). Consideram que a prevenção depende dos cuidados em residências e também em contextos de educação e cuidado infantil (Fujisawa et al, 2020).
Os pediatras podem orientar os pais, mas nem sempre os professores e auxiliares de educação infantil conhecem ou consideram esses riscos ao planejar atividades com as crianças ou ao alimentá-las no contexto escolar. Nem todos cursos de pedagogia incluem a disciplina sobre cuidados com a saúde em sua grade curricular.
Como consultora em cuidados com as crianças em contexto de educação infantil, percebo que há uma certa resistência, ou mesmo desinformação, dos professores e gestores escolares sobre a gravidade da introdução ou aspiração de objetos ou determinados alimentos oferecidos às crianças. Tenho lido comentários de professores nas redes sociais que evidenciam que há uma dificuldade de interlocução entre os profissionais de saúde e os de educação. Isso talvez seja uma resistência causada pela longa trajetória dos profissionais de educação de crianças menores de três anos para tentar sair da tutela ou da subordinação dos profissionais de saúde que, ao lado dos profissionais de serviço social, atuavam nas creches antes da Constituição de 1988 reconhecê-las como serviços educacionais.
Concordo que as crianças aprendem pela experiência, ou seja, pela convivência, participação, exploração, investigação, interação nos diversos ambientes onde está inserida, mas como adultos responsáveis temos que avaliar e ponderar riscos e benefícios de cada situação, considerando o desenvolvimento potencial de cada criança, seu histórico, suas características.
Nos últimos anos, inspirados em creches/escolas italianas, há uma ênfase na exploração e brincadeiras com “objetos de largo alcance” (diversos materiais incluindo sucatas, caixas de papelão, pedaços de madeiras, galhos, sementes, folhas, etc), ou seja, além dos brinquedos que o INMETRO autoriza e recomenda para cada idade.
Embora essa oportunidade de criação a partir de objetos não estruturados enriqueça as oportunidade de construção de conhecimentos pelas crianças, requer uma certa triagem dos materiais disponibilizados aos menores de cinco anos, sobretudo aos menores de três anos. Avaliar o material quanto aos riscos de engasgos, aspiração, intoxicação, contaminação química ou biológica dependendo de suas origem. . Nesse momento de pandemia pelo SARsCov2, também nos preocupa a higienização desses materiais pois a maioria não pode ser higienizada. Embora possamos deixá-los isolados alguns dias para esperar que um potencial vírus, eliminado pela respiração, coriza ou espirro torne-se inviável, se houver contaminação por bactérias elas podem crescer durante esse período de “quarentena” no material, sobretudo se ele for de origem orgânica.
Os profissionais de saúde às vezes são taxados de “exagerados” e “higienistas”pelos profissionais da educação ou mesmo pelas famílias. Mas quem já experimentou o socorro de uma criança no serviço de saúde, com suspeita de ter se asfixiado, ou que inseriu um objeto estranho no nariz, ou ao cuidar delas na Unidade de Terapia Intensiva, avalia que é necessário uma orientação mais consistente para que todos colaborem entre si para evitar essas situações sem impedir necessariamente brincadeiras e experiências fundamentais para o desenvolvimento infantil.
A prevenção de acidentes deve sempre começar pela análise da “árvore de causas”. O que foi necessário e suficiente para causar os acidentes? Como poderia ter sido evitado? Como proteger outras crianças?
Os seres humanos aprendem pela experiência própria ou pelas dos outros quando refletem juntos sobre elas, estudando casos que já ocorreram, lendo sobre as pesquisas de incidência de agravos à saúde, para saber como promover o crescimento e desenvolvimento pleno das crianças. Mas, às vezes, por nunca ter vivido ou lido sobre uma tragédia como as que afetam as famílias que tiveram um ente querido morto ou com lesões neurológicas por um engasgo, ou introdução de um objeto nos orifícios corporais, desmerecem as recomendações dos mais experientes.
Na década de 1990 ouvi pela primeira vez um relato de dona de escola infantil em um bairro nobre de São Paulo, sobre um fato que a marcou. No quintal da escola tinha uma linda jabuticabeira. E quem não gosta dessa árvore repleta de frutinhas pretas e brilhantes? Assim como nós, as crianças também. E talvez por isso outras escolas de São Paulo continuam mantendo em seus quintais belas jabuticabeiras. Mas eu, que ouvi o relato da dona da escola, tenho receio de que ocorra o mesmo que marcou para sempre essa grande educadora, que atua até hoje em programas de formação de professores e gestores de educação infantil. No horário da saída da escola, uma mãe ao conversar com ela com o filho no colo, próximos à árvore , percebeu que ele esticou o braço tentando pegar a fruta e o ajudou. Ele colocou a fruta na boca e logo depois engasgou, asfixiando-se. O socorro foi imediato, mas a criança teve que ser internada em uma Unidade de Terapia Intensiva para se recuperar.
Em 2005, Dra Julia Kerr Catunda, médica pediatra e professora de medicina, planejou um curso de Suporte Básico de Vida especialmente para educadores de creches mantidas por empresas que supervisionávamos, que depois foi extensivo à rede pública de Cajamar (SP) e outras escolas . Sempre orientamos que, além de saberem reconhecer sinais de perigo e prestar os primeiros cuidados, é fundamental evitar situações de risco. Todas as situações de acidentes que ocorrem na escola, mesmo que leves, sem grandes consequências, tem que ser investigadas por meio da metodologia de “Árvore de Causas”, para detectar possíveis falhas ainda não observadas.
Em 2011, analisamos todas as notícias publicadas na mídia que pudemos acessar pelo Google, ficando evidente, que alguns casos de engasgo, ou morte súbita no berço, ocorrem no primeiro dia ou semana de adaptação da criança à unidade escolar. Por que isso tem relação com o engasgo? Talvez porque a criança chore durante ou após a refeição, e depois é colocada para dormir, sem alguém ao lado para observá-la constantemente? (Maranhão, 2011).
Entre outras causas evitáveis, a morte do filho por asfixia por um pedaço de salsicha durante uma excursão escolar, resultou na Lei Lucas, que obriga todas as escolas a prepararem toda a equipe para o Suporte Básico de Vida. Mas não basta esse curso, é preciso prevenir, pois nem sempre, por melhor que o suporte seja eficaz quando se constata os primeiros sinais de risco de asfixia da criança, consegue-se evitar complicações. Foi o que ocorreu com uma criança que frequentava uma escola de educação infantil pública de Sorocaba (SP) há cerca de um ano.
A professora, que foi perdoada pela mãe que perdeu a filha de um ano e nove meses por engasgo com uma jabuticaba, provavelmente desconhecia o risco quando planejou uma atividade de leitura do livro Moça Bonita do Laço de Fita, e para torná-la mais “rica” levou as frutas para as crianças verem, como ela relatou. Talvez tenha permitido a manipulação, ou perdeu o controle sobre todas as crianças, e uma delas se engasgou. Mesmo sendo socorrida por uma técnica de enfermagem que estava presente na escola, teve que ser assistida na Unidade de Terapia Intensiva, morrendo dez dias depois por complicações. Me solidarizo com essa professora e com a mãe, pois suas vidas estarão marcadas tristemente por esse fato.
Recentemente vimos nas redes sociais uma notícia sobre uma criança de aproximadamente 11 meses que se engasgou com uma uva oferecida pelo pai, enquanto a mãe trabalhava. E, sem dúvida, tocar neste tema me deixa preocupada sobre a repercussão neles, caso leiam esse texto, espero que me perdoem. Mas o caso está sendo abordado por uma boa causa, para alertar outros pais, mas sobretudo professores, gestores, cozinheiras, auxiliares, zeladores, jardineiros que atuam em contexto de educação infantil.
Precisamos sempre pesar os riscos e benefícios dos cenários de brincadeiras, interações e no planejamento dos cuidados com as crianças, sobretudo quando temos várias crianças em um mesmo grupo e com um ou dois adultos responsáveis pela integridade deles. E isso significa que precisamos zelar dos ambientes externos e internos para que sejam seguros, pois elas terão outras oportunidades de experimentar diversos alimentos, ou explorar os objetos, a natureza com segurança depois de terem desenvolvido habilidades para o autocuidado. Ou seja, as cozinheiras podem fazer um suco de jabuticaba, cortar as uvas e outras frutas, as salsichas em uma forma que possam ser degustadas sem risco.
Após o curso de Suporte de Vida para equipe de uma escola, onde ressaltamos o risco das frutas redondas, lisas, como a jabuticaba, visitei a unidade meses depois e vi um cartaz com fotos de crianças menores de três anos sentadas em volta da árvore com o seguinte título: “Saboreando Jabuticabas”, apresentando para os pais as atividades desenvolvidas pelos professores. Nesse momento, percebi que nossa recomendação no curso de primeiros socorros não havia sido ouvida ou assimilada por todos, ou seja, o risco havia sido desconsiderado. Precisamos avaliar porque isso ocorre, como podemos ensinar aos responsáveis pelas crianças sobre o cuidado necessário em cada fase.
O mesmo observa-se com as brincadeiras com bexigas de látex, usadas em festas infantis, mas que quando estouram podem resultar em pedaços que quando levados à boca para brincar ou explorá-los, podem causar uma asfixia severa, pois não há como retirá-los por aderirem intensamente à mucosa sob pressão respiratória.
Uma mãe que foi buscar o seu bebê na creche observou nele movimentos faciais como se estivesse com náusea, prestes a engasgar. Ela pediu ajuda da professora que deitou-o sobre um colchonete para, como aprendera no curso de Suporte Básico de Vida, examinar sua boca, tentando visualizar o que o incomodava, evitando explorar a mucosa bucal às cegas. Ela conseguiu visualizar e retirar uma tira de plástico de mais ou menos três cm de comprimento por um cm de largura. A mãe e a professora não conseguiam entender como o bebê teve acesso a esse pequeno pedaço de fita plástica, pois não havia material semelhante na unidade. A diretora me solicitou que eu investigasse o ocorrido, empregando o raciocínio da “Árvore de Causas” a partir da seguinte questão norteadora: “O que foi necessário e suficiente para esse incidente?”. O fato ocorreu logo após as crianças terem retornado para a sala onde antes do almoço haviam participado de uma atividade de artes. A auxiliar de limpeza sempre limpava a sala no período em que as crianças estavam ausentes, durante o almoço e sono da tarde, preparando o ambiente para quando retornassem.
A auxiliar de limpeza me relatou que ao limpar a sala sempre encontrava o material que mostrei a ela, confirmando que era um pedaço de fita adesiva transparente que a professora colava folhas de papel sobre os quais as crianças faziam atividades artísticas ou sensoriais com tinta. Ao encerrar a atividade, a professora retirava os papeis puxando-os, sem perceber que parte das fitas ficava aderida ao piso. Ao limpar o piso, eles se soltavam sendo recolhidos pela auxiliar de limpeza, que não percebeu que um deles permaneceu solto em algum lugar do piso. Como o bebê engatinhava (e pelas características do desenvolvimento é um grande investigador), provavelmente encontrou o pedaço de fita e foi experimentá-lo na boca. Foi uma situação inusitada, nunca prevista por mim, nem pelas professoras e gestora da escola, o que demonstra o risco que nem sempre conseguimos prever.
Assim, a prevenção desses acidentes e suas complicações depende sobretudo da constante vigilância do ambiente, da informação e orientação dos familiares, cuidadores, professores de educação infantil para que possam identificar e evitar riscos potenciais, protegendo as crianças até que tenham habilidades para cuidar de si. (DGM)
Referências
Granja, M. E a mãe a insistir no amendoim.Revista Portuguesa de Clínica Geral 25(2). Março, 2009. Matosinhos Local Health Unit – Portugal DOI: 10.32385/rpmgf.v25i2.10605
Lifschultz, B. and Donoghue, E. “Deaths Due to Foreign Body Aspiration in Children: The Continuing Hazard of Toy Balloons,” Journal of Forensic Sciences, Vol. 41, No. 2, 0, pp. 247-251, 1996. https://doi.org/10.1520/JFS15422J. ISSN 0022-1198
Souza, S.T,E V.. Aspiração de objetos estranhos por menores de 15 anos: uma década de experiencia. Dissertação Mestrado em saúde da mulher e saúde materno-infantil. , 59 p. Universidade Federal do Maranhão, São Luis, 2007.
Andrew R. Bamber,Jeremy Pryce,Michael Ashworth ENeil J Sebire. Aspiração fatal de corpos estranhos em bebês e crianças. Páginas 42-48 | Recebido em 12 de agosto de 2013, aceito em 16 de setembro de 2013, publicado online: 21 de outubro de 2013
Fujisawa J, Mutoh T, Kawamura K, Yonezawa R, Hirai M, Morioka I. Age-Specific Differences in Foreign Bodies Ingested by Children: A Cohort Study of 252 Japanese Cases . Department of Pediatrics and Child Health, Nihon University School of Medicine, 30-1, morioka.ichiro@nihon-u.ac.jp. Received: 24 November 2019; Accepted: 15 January 2020; Published: 19 January 2020
Figueiredo,R.R.Azevedo,A.A.; Kos,A. Octávio de Ávila and Tomita,S.. Corpos estranhos de fossas nasais: descrição de tipos e complicações em 420 casos. Rev. Bras. Otorrinolaringol. [online]. 2006, vol.72, n.1, pp.18-23. ISSN 0034-7299. https://doi.org/10.1590/S0034-72992006000100004.
[1] Em referencia ao nome do programa Papo de Mãe, TV Cultura, para o qual contribuo com essa reflexão, e ao fato de eu ser além de educadora, mãe e avó também. .
[2]([2] http://revistacrescer.globo.com/Revista/Crescer/0,,EMI326514-17729,00.html, 2013.