Em entrevista ao Papo de Mãe, a endocrinologista Dra. Fernanda André comenta sobre a antecipação da puberdade, suas causas e impactos
Maria Cunha* Publicado em 26/06/2021, às 11h42
A puberdade precoce é um tema que vem ganhando muita visibilidade e espaço nas discussões. A busca pelo termo "puberdade precoce feminina" aumentou em 200% no Google Trends nos últimos doze meses.
O fenômeno atinge crianças e ocorre quando, devido a um amadurecimento biológico acelerado por meio das modificações hormonais, as características sexuais acontecem antes do tempo normal que deveriam ocorrer. Com isso, há a aceleração do crescimento e do desenvolvimento sexual. A Dra. Fernanda André, endocrinologista pediátrica, comenta o assunto:
Com a puberdade precoce, antecipadamente, começa a aparecer mama e pelo pubiano nas meninas, antes dos 8 anos. Já nos meninos, antes dos 9 anos, é possível ocorrer o aumento do volume dos testículos e o aparecimento dos pelos”.
A médica explica que nesse processo há um tempo de mudança, existem estágios e fases de puberdade. A menina, por exemplo, começa a ter mudanças perceptíveis nos seios, primeiro com um brotinho, depois com o aumento da glândula, progredindo para um “estufadinho” na auréola, como se fosse duas mamas.
“Esses estágios não podem passar de um pro outro com menos de seis meses e nem ficar mais de dois anos parado no mesmo estágio. Então, além do pediatra e dos pais estarem atentos ao início dos sinais de puberdade, também precisam estar atentos à velocidade da mudança do corpo das crianças”, completa a Dra. Fernanda André.
A endocrinologista pediátrica ressalta que existem alguns fatores que podem ter contribuído para a puberdade estar aparecendo de forma mais precoce, principalmente nas meninas:
Existem causas genéticas, crianças que nasceram pequenas pra idade gestacional, crianças com histórico de puberdade precoce na família e o excesso de peso. A obesidade tem contribuído muito, porque a gordura aumenta a biodisponibilidade do estrogênio, hormônio sexual feminino, que começa a estimular a glândula”.
Além disso, a médica conta que um dos fatores que se discutem muito e que pode ter influenciado negativamente para a maior ocorrência da puberdade precoce é o aumento do IMC, o Índice de Massa Corpórea, que é uma relação entre o peso e a altura.
Isso ocorre porque as crianças, com esse período de isolamento social, pararam de fazer atividades físicas, as movimentações se restringiram, ficaram muito em casa e comeram mais.
“O excesso de telas, falta de atividade física e a alimentação inadequada acabam impactando no aumento de peso e esse fator pode influenciar no surgimento da puberdade precoce. No colégio, a criança tem aula de educação física, se movimenta, vai pro recreio, sobe, volta pra sala. Em casa, isso não acontece”, explica a endocrinologista pediátrica Dra. Fernanda André.
De acordo com a médica, em seu consultório, ocorreu um aumento muito grande dos casos de puberdade precoce ou acelerada, o que, segundo ela, também tem sido visto em estudos.
A endocrinologista ressalta que além do desenvolvimento prematuro, a puberdade precoce pode trazer outras complicações como: comprometimento da estatura corporal e influência na aceleração da idade óssea, hipertensão, diabetes tipo 2 e aumento do risco de certos tipos de câncer, como mama e ovário.
É importante dizer que, segundo dados compartilhados pela Dra. Fernanda André, grande parte das crianças que apresentam o distúrbio tem puberdade precoce central, a forma mais comum da doença. Neste tipo, a hipófise, uma região do cérebro, libera para organismo o folículo-estimulante (FSH) e o hormônio luteinizante (LH) - termo que também obteve o aumento de 130% na ferramenta de rankeamento - substâncias que estimulam os ovários a produzir estrógeno desencadeando na maturação acelerada do corpo.
A médica finaliza ao dizer que há tratamento para a doença. Segundo ela, assim que o caso for identificado,deve ser avaliado por uma endocrinologista pediátrica para fazer o diagnóstico e, se necessário, iniciar o tratamento adequado, o que possibilita evitar ou amenizar os impactos no desenvolvimento da criança.
O tratamento depende do tipo de puberdade precoce e em muitos casos é preciso atuar para frear o processo.
“Quando a puberdade está apenas um pouco antecipada e evoluindo lentamente, em geral, não há necessidade de medicamentos, mas a criança deve ser acompanhada por um especialista" pontua a endocrinologista pediátrica Dra. Fernanda André.
Em relação ao uso de hormônios de crescimento, a médica explica que é necessário, antes de qualquer procedimento, fazer um cálculo de previsão de estatura final para avaliar se a criança vai ficar com uma estatura patológica para que seja possível bloquear a puberdade, usar GH.
“Isso é bem controverso na própria especialidade, porque a reposição hormonal é feita nas crianças que têm deficiência, não secretam bem ou tem uma indicação precisa pra usar o hormônio de crescimento. Existem situações em que a menina já é baixa e ela está com uma previsão de estatura de 1,40 e pouco, totalmente fora do normal de uma mulher na vida adulta. Esse caso tem que ser avaliado, porque isso pode comprometer a vida dessa pessoa no futuro, no sentido não de risco de vida, mas nas atividades do dia a dia, como dirigir".
A Dra. Fernanda André reforça que não se pode deixar uma criança de 5 ou 6 anos menstruar, por diversas questões, inclusive emocionais.
“Quanto mais cedo você está exposto aos hormônios sexuais, no caso da puberdade precoce, você aumenta o risco de desenvolver alguns tumores que são estimulados por esses hormônios sexuais. Por isso, na puberdade precoce, o bloqueio é indiscutível, já a entrada do hormônio de crescimento, a gente discute mais", conclui a endocrinologista pediátrica Dra. Fernanda André.
*Maria Cunha é repórter do Papo de Mãe
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