Antes de ser pai ou mãe se pergunte: você realmente quer dedicar sua vida para outro ser humano? Ou só quer uma foto com muita repercussão?
Vinicius Campos* Publicado em 16/04/2021, às 00h00 - Atualizado às 17h26
Tarde de quinta-feira, faz calor aqui em Buenos Aires. Meu filho de quinze anos faz aulas virtuais, o de dezessete foi à escola presencialmente, e a mais velha na casa de uma amiga, por mais que eu não esteja de acordo. Aproveito o silêncio em casa para ler as notícias. Política, desgraças, e mais uma matéria sobre o brutal assassinato do menino Henry.
Uma babá contou que o garoto era medicado contra ansiedade. A mãe disse que ele não dormia nunca. Então dava calmante. Calmante para um menino de quatro anos! A manchete do UOL dizia algo assim: médicos não aconselham o uso de calmantes em crianças.
Fiquei com vontade de gritar: CHEGA!
Não chega do caso do Henry, e sim chega de tudo isso, chega de quem pensa que vida é rede social.
A vida não é uma foto. Não é o vídeo brega do pedido de casamento. Nem a bobagem do primeiro ultrassom. A vida não é nem de longe parecida com a emoção forçada do chá de bebê, ou do vergonhoso chá de revelação do sexo do bebê com exagero de cor de rosa, de cor azul, com cafonices pra tentar chamar a atenção e conquistar mais “likes”.
Educar filho é outra coisa.
Não tem a ver com foto, nem com sexo, nem com “likes”.
Educar filho é escutar, abraçar, acolher.
É chorar sozinho achando que a gente fez uma grande besteira. É ter dor de barriga no meio da noite por acreditar que vai dar tudo errado. É sorrir ao ver que seu pequeno é feliz e livre. É respirar aliviado quando ele trata outra criança bem e você tem a sensação de que alguma coisa ele entendeu.
É pensar mil vezes antes de dizer alguma coisa pra dar o melhor exemplo, é mudar a própria dieta pra que o pequeno não nos veja comendo bobagem. Educar filho é fazer discurso de amor, é procurar filmes que nos ajudem a dar a mensagem. Educar filho é comprar livro infantil e ler antes pra ver o que o autor quer dizer aos nossos pequenos. É alertar que o “felizes para sempre” dos contos de fada infantil é pura mentira e que a vida é construção, compreensão, companhia e amor.
Antes de ser pai ou mãe se pergunte: você realmente quer dedicar sua vida para outro ser humano? Ou só quer uma foto com muita repercussão? Você está realmente disposto a ser odiado, maltratado, colocado em segundo, décimo, centésimo lugar, e continuar se dedicando diariamente para a construção de uma pessoa?
Se a resposta foi não, se você titubeou por um instante, talvez o que você queira mesmo seja um cachorro bonitinho, adestrado, com laço de fita. Ou um sobrinho fofo que quando começa a encher, a gente leva pro pai e tudo resolvido.
Sejamos francos. Criança (e óbvio que falo da maioria, não de casos médicos comprovados) não precisa de medicamento pra ansiedade. Precisa de orelha, colo, terapia, livros, contenção, ar livre, se sujar de barro, andar de bicicleta, comida caseira.
Criança não é perfeita como o feed dos famosos. Criança não é boneco pra gente colocar roupinha metida a besta e exibir pros outros. Criança é muito mais que tudo isso.
A imagem da família perfeita, com filhos felizes e limpos, é uma mentira. E tentar encaixar nossas crianças numa imagem idealizada é de uma maldade imensa, e de um desperdício horroroso, porque a convivência com nossos filhos, a superação das dificuldades, as horas de sono mal dormidas, elas são fundamentais para que o vínculo seja cada vez mais forte e saudável.
Ups, campainha… acabou a paz. Vou lá, superar meus limites e saborear as imperfeições da minha família. Nos vemos na próxima sexta-feira.
Referências dos filhos adolescentes
Deixem nossas crianças fora disso
Ler faz bem, por Vinicius Campos
Especial dia dos pais. Uma família com 2 pais, 3 filhos adotivos e muito amor envolvido
18 de Abril – Dia Nacional do Livro Infantil: 10 passos para escolher um bom livro para as crianças