O pediatra Moises Chencinski analisa pesquisa sobre a amamentação no Brasil: "Copo meio cheio ou meio vazio?"
Dr. MOISES CHENCINSKI* Publicado em 16/11/2021, às 09h37
Cientistas e estatísticos trazem resultados de pesquisas, seguindo metodologia ética e coerente com os parâmetros mundiais. Todos (cientistas, estudiosos, curiosos, imprensa, enfim ...) analisam os dados sob suas perspectivas e, na maior parte das vezes, através de “achismos”, e os divulgam como verdades.
Otimistas dirão que o copo está meio cheio. Pessimistas manterão a imagem do copo meio vazio.
E os “realistas”? Esses dirão só que o copo está pela metade, ou seja, uma parte já está feita, mas que ainda há mais por se fazer.
Abre parênteses para um conceito interessante que vi em um post do Instagram da Dra. Luciana Lancha (Doutora em Nutrição e Bacharel em Educação Física), antes de continuarmos.
DISCORDAR é diferente de JULGAR.
Discordar: ter opinião contrária de (alguém); divergir.
Julgar: formar conceito, deliberar na qualidade de juiz ou árbitro.
Essa diferença é um dos pilares da comunicação não violenta, pena que pouco usado nas mídias sociais.
Fecha parênteses e de volta ao textão.
Foi divulgado recentemente o resultado do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (ENANI-2019). O relatório da pesquisa sobre aleitamento materno revelou dados muito importantes, interessantes e que merecem ampla divulgação para análise e elaboração de estratégias eficazes de políticas públicas. E mesmo para quem não é exatamente da área, mas que se interessa e se preocupa com a saúde materno-infantil no Brasil, conhecer números e realidades pode sensibilizar e conscientizar, para proteger, apoiar e promover a amamentação.
A última pesquisa sobre aleitamento materno (AM) no Brasil foi no PNDS-2006, portanto, há 13 anos. A OMS traçou metas para as prevalências de aleitamento materno para 2.030. São muitos números e, para não confundir, estão aqui apenas alguns deles.
Matemáticamente e estatisticamente, os dados são assim: numéricos. Eles trazem uma média dos resultados obtidos. Vejam essas duas análises pinçadas do ENANI-2019.
- Regiões (Norte-N, Nordeste-NE, Sudeste-SE, Sul-S, Centro Oeste-CO)
- Raça (Branca-B, Parda-Pd, Preta-P)
- Amamentar na 1ª hora de vida (62,4%) salva muitos lactentes. Mas a faixa das taxas é muito ampla, indo de 58,5 (Sudeste) a 73,5% (Norte). Mas existe também uma diferença na avaliação por raça com 61,7% (B), 63,4% (Pd) e 58,4% (P).
- AME em menores de 6 meses (45,8%) teve variações de 39% (Nordeste) a 54,3% (Sul) e 43,8% (B), 47,1% (Pd) e 52,6% (P).
- A amamentação cruzada (21.1%), contraindicada pelo Ministério da Saúde desde 1993 / 1996, vamos de 12,5% (Sul) a 34,8 (Norte) e taxas de 15,5% (B), 23,7 (Pd) a 24,8% (P).
Quantos “Brasis” existem dentro do Brasil, país de dimensões continentais, colonizado por um povo de origens, culturas, padrões socioeconômicos, geográficos tão variados?
Muitas dessas taxas tiveram aumentos em relação aos dados de 2006, mas a maioria muito discreta e muito aquém do desejado, especialmente se forem levados em conta os investimentos e os programas de saúde voltados para essa área, nesses últimos 13 anos.
Além disso, os resultados para os indicadores de amamentação observados no ENANI-2019 nos confrontam com as metas propostas pela OMS para o ano de 2030, evidenciando, em especial para os indicadores de AME e AM continuado no segundo ano de vida. A meta da OMS para 2030 é de que pelo menos 70% das crianças com menos de 6 meses de vida estejam em AME, enquanto o ENANI-2019 revelou prevalência de 45,8%.
Os resultados para AM continuado no segundo ano de vida não são muito diferentes. A meta da OMS 2030 é de 60% e os dados do ENANI-2019 revelaram prevalências de 35,5%.
Como se vê, o copo está quase pela metade (a mais em alguns índices e a menos em outros). Meio cheio? Meio vazio? Independentemente da avaliação, estamos (ou passamos) na hora de planejar e de correr atrás do prejuízo (das metas).
Cientista: Que ou aquele que é especializado em uma ciência.
Ciência: Ramo específico do conhecimento, caracterizado por seu princípio empírico e lógico, com base em provas concretas, que legitima sua validade.
Curioso: Que ou aquele que, sem conhecimento teórico, executa vários serviços; prático. Trabalho amadorístico, sem cunho profissional; diletantismo.
Estatística: Representação numérica e comparativa, em tabelas ou gráficos, dos resultados da análise desses fenômenos.
Estudioso: Que ou quem aperfeiçoa seus conhecimentos em uma determinada área de conhecimento; especialista.
Otimismo: Disposição, natural ou adquirida, para ver as coisas pelo bom lado e esperar sempre uma solução favorável das situações, ainda que as mais difíceis
Pessimismo: Hábito de antecipar fracasso, má sorte, ou predisposição para julgar os fatos pelo lado mais desfavorável.
Realismo: Disposição para pensar e agir de acordo com a realidade das coisas ou dos fatos, rejeitando os planos visionários ou idealizados, voltado ao que é prático ou objetivo; pragmático
*Dr. Moises Chencinski , pediatra e homeopata.
Membro do Departamento Científico de Aleitamento Materno da Sociedade Brasileira de Pediatria (2016 / 2019 – 2019 / 2021).
Autor dos livros HOMEOPATIA mais simples que parece, GERAR E NASCER um canto de amor e aconchego, É MAMÍFERO QUE FALA, NÉ? e Dicionário Amamentês-Português
Editor do Blog Pediatra Orienta da Sociedade de Pediatria de São Paulo.
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