Feminismo, antirracismo e educação: uma entrevista com Luana Tolentino

Mariana Kotscho e Roberta Manreza fizeram uma entrevista especial com a escritora e educadora Luana Tolentino. É a nossa homenagem a todas nós mulheres pelo nosso dia

Mariana Kotscho* Publicado em 08/03/2021, às 00h00 - Atualizado às 11h59

A escritora e educadora Luana Tolentino -

Antes que questionem a importância do dia 8 de março e de ter um Dia Internacional da Mulher, é bom deixar claro que enquanto mulheres sofrerem feminicídio, violência doméstica, enfrentarem desigualdades e injustiças, este dia deverá existir.

Se pensarmos nas mulheres negras, então, a realidade é ainda mais cruel: elas são vítimas não só do machismo na nossa sociedade, mas também de racismo.

Por isso, nossa escolha para a entrevista especial neste dia 8 de março de 2021 foi dar voz para a brilhante educadora e escritora mineira Luana Tolentino, doutoranda em educação e autora do livro “Outra educação é possível: feminismo, antirracismo e inclusão em sala de aula”. 

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Filha de Enelita, que trabalhou como empregada doméstica e hoje é cozinheira, e de seu Nicolau, que tem um bar, Luana também começou trabalhando como empregada doméstica. Mas os livros, os pais, a força de vontade e políticas públicas fizeram com que a vida dela mudasse completamente e agora a professora se prepara para virar também doutora em educação (ela entrou na UFMG).

“É importante falar do impacto da educação na minha vida. Eu venho de uma família pobre, filha de mãe semi-alfabetizada e pai que concluiu o ensino fundamental. Mesmo nos momentos de precariedade, cresci numa casa cheia de livros. Meus pais tinham essa percepção do valor da educação” (LT)

Um dos focos do trabalho dela é a formação inicial e continuada de professores. Luana também chama a atenção para a triste realidade da mulher negra, como ela,  no nosso país: “As mulheres negras nesse país estão na parte mais baixa da pirâmide. Entre a população que não aprendeu a ler nem escrever, as mulheres negras são maioria. Estão em funções de menor prestígio social, que as colocam em condição de subalternidade. A maior parte das empregadas domésticas são mulheres negras. Eu reconheço meu lugar de exceção”, lamenta Luana. E completa: “Daí a minha luta para que outras consigam acessar os lugares que hoje posso acessar”.

Assista aqui à primeira parte da entrevista com Luana Tolentino

“O fato de eu estar aqui hoje, de eu escrever, de eu chegar ao doutorado, sair da condição de empregada doméstica à de doutoranda, se deve à educação. O mais importante é levar aos estudantes o valor da educação”. (LT)

Luana Tolentino também ressalta a importância das políticas públicas de combate ao racismo na educação. “Eu sou filha das políticas públicas de expansão do ensino superior, das políticas públicas de cotas, das ações afirmativas e infelizmente essas políticas estão seriamente ameaçadas no momento atual.”

Assista aqui à continuação da entrevista com Luana Tolentino

"É um genocídio do futuro o que estamos vendo atualmente na educação neste momento de pandemia, com a falta de investimento e de uma política por parte do MEC."

Sobre a importância da inclusão da cultura africana a afro-brasileira no currículo escolar, determinada por lei, Luana diz que isso é fundamental. “No nosso país não se espera que nós, mulheres negras, estejamos neste lugar de pensadoras, de produtoras de conhecimento. A expectativa que nosso país tem é que estamos neste mundo apenas para servir e limpar a sujeira dos outros.”

Capa do livro de Luana Tolentino

Em seu livro, Luana ressalta o papel das escolas públicas também como lugar de desenvolvimento do pensamento, a necessidade de combater o racismo no ambiente escolar e de tratar do feminismo, das desigualdades sociais e de gênero. Infelizmente, ela diz,  neste país  há desprezo pelo ensino público, ele é pensado para a manutenção das desigualdades sociais: “Pensam numa educação pobre para os pobres, mas há muita coisa boa sendo feita e os professores têm levado a educação de uma maneira valente”.

“A educação tem que ser o pilar de um país se a gente quiser um outro modelo de sociedade”

Os pais de Luana não veem a hora de pendurar o diploma de doutora da filha na parede de casa. “Nós estamos conseguindo romper com esse ciclo de gerações inteiras de empregadas domésticas”.

O momento é difícil, mas ouvir Luana Tolentino nos dá um alento de que ainda há esperança. Assista à entrevista completa no Youtube do Papo de Mãe.

“Quem vai dar jeito no nosso país somos nós, mulheres negras”. (LT)

E Luana termina a entrevista com a citação de um ex-aluno, o Marcelo. Ele disse pra ela: “Eu aprendi que a pobreza não pode tirar da gente o direito de sonhar”.

@lua_tolentino

*Mariana Kotscho é jornalista e apresentadora do Papo de Mãe

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