Uma crônica do escritor Plínio Camillo. Ele é pai de Beatriz
Plínio Camillo* Publicado em 24/04/2021, às 00h00 - Atualizado às 13h29
Podia ter perguntado se é corintiano. Ou se sabe sambar. Mas não! Fui para o franco interrogatório paternal: Rapagão alinhado na minha sala. Atento e ereto
— Nome? Idade? Signo solar? Tem aí um atestado de bons antecedentes?
Pausa dramática. “Com certeza a minha filha ensaiou muito o danado! Respondeu que se chama Cauã. Que tinha, sim, um atestado e era um ano e dois meses mais novo que minha filha. Signo e ascendente em Escorpião. “Intensos, rancorosos e vingativos. Sempre perseguem a revanche com persistência.”
— Amo e respeito muito a sua filha, senhor! — Minha pequena filha tem a lua em peixes. “Empáticos, são tocados pelos sentimentos e emoções dos outros”
— Sei … mora onde?
— Na rua Gamboa — neste momento apliquei a do morde-assopra
— Conheço … meu velho bairro! Morei na Ibiapava
— Sei sim senhor …
— Estudei na Escola do Bairro Paraíso. Século passado!
— Minha mãe também. Ela sempre morou ali
— Qual o nome de sua mãe?
— Rosinha.
— Rosinha ou Rosa?
— O nome da minha mãe é Rosinha Christina.
Gelei
“Era fissurado na Rosinha.
Signo de Peixes
Foram três meses de varanda e só algumas bitoquinhas.
Três meses de parquinho e abraços de roda gigante.
Três meses detrás da escola e nem toquei nos peitinhos.
Quando ficou caidinha, apliquei o meu babado
Dias cabreiro. Não falava nada.
Outros grilado. Apenas gemia.
— Que foi meu tijolinho? — soltei o meu texto
— Num sem se você me ama mesmo
— Como?
— Num sei… — Minha milonga foi lançada — Preciso de uma prova do seu amor por mim.
— Que prova?
Mais alguns dias fingindo encafifado até que ela cedeu.
Pintei o caneco!
Capotei na área!
Comi a Rosinha!
Depois passou…
Começou a ficar chatinha…
Sem sal…
E eu já estava arrastando asa para Helena.
Dei o papo fajuto.
— O problema não é você: sou eu!
Gritou e apelou para a ignorância: xingou a minha mãe.
Tive que tomar uma atitude.
— Sifu Rosinha.
Rosinha Rosa enxugou as lágrimas e me mandou um olhar de atropelamento.
Lançou a maldição
— Um dia o meu filho vai fazer com a sua filha o mesmo que você está fazendo comigo.”
Congelei!
18 por 10
— Pai, você está bem?
— Tô legal, filha… tô sim … Você acredita em carma?
— Não — para o Cauã — Vamos meu tijolinho?
— Com licença, senhor
Saem e na espera do elevador dão um beijo de novela “Com qual pilantra a minha flor aprendeu estas coisas!?”
Ela chegou um minuto antes das quatro e trinta e dois.
Manhã seguinte.
— Rapaz distinto!
— Who?
— O seu amigo Cauã…
— Namorado, pai, N-A-M-O-R-A-D-O.
— Educado também …
— Tá me tirando pai?
— Tô não…
— Sei …
Tarde seguinte
— Olha, a sua mãe vai se apresentar com o grupo dela de dança folclórica do Paraná na semana que vem, podia chamar o seu N-A-M-O-R-A-D-O.
— Tá …
Uma noite depois
— Filhota, seu irmão irá promover o churrascada vegetariana na sexta. O Cauã podia vir… ele gosta de cenoura?
— Num sei …
Na manhã depois de duas noites
— Queridinha, sua prima vai cantar num sarau hoje …
— Sei não … a gente combinou outra coisa …
— Você que sabe …
Muitos dias depois.
— E o Cauã?
— Esquece!
— Como?
— Já era!
— What?
— Pai! Já deu …
*Plinio Camillo é escritor e pai de Beatriz.
Autor de :
NOTAS DE ESCURECIMENTO – Contos de Escrevivência – Colli Books
LUIZA – romance infanto-juvenil sobre uma negrX escravizada – Editora Kazuá
OUTRAS VOZES – coletânea de contos sobre o negrX escravizado no Brasil – 11Editora
O NAMORADO DO PAPAI RONCA – romance infanto juvenil – ProAC 2012 – Editora Prólogo – Selo Mundomundano
Entre outros …
Blog: Alfarrábios – http:| | pliniocamillo.wordpress.com|
Notas de Escurecimento – Gerações – https://www.youtube.com/
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