Papo de Mãe

Bebês irmãos de autistas são mais suscetíveis ao desenvolvimento do transtorno

Roberta Manreza Publicado em 07/01/2016, às 00h00 - Atualizado às 18h36

Imagem Bebês irmãos de autistas são mais suscetíveis ao desenvolvimento do transtorno
7 de janeiro de 2016


Pesquisadora do IPUSP avalia interação entre pais e bebês irmãos de crianças com transtorno do espectro do autismo

Por Joana Leal – Agência Universitária de Notícias – Instituto de Psicologia da USP

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No filme Gilbert Grape – Aprendiz de Sonhador, lançado em 1994, o ator Leonardo DiCaprio interpreta Arnie, um adolescente que está prestes a completar 18 anos e sofre de autismo. Na trama, o personagem passa por crises constantes, nas quais, por vezes, tenta fugir de casa ou agredir a si próprio. A doença vivida por Arnie atinge cerca de 70 milhões de pessoas em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), e costuma expressar seus  sinais inciais durante os três primeiros anos de vida das crianças. O problema é tema central da pesquisa “Avaliação de intervenção na interação entre pais e bebês irmãos de crianças com transtornos do espectro do autismo”, desenvolvida no Instituto de Psicologia (IP) da USP por Julia Garcia Durand.

Em seu estudo, ela avalia o comportamento de bebês irmãos de crianças com autismo, pois eles constituem um grupo de maior risco para o desenvolvimento da doença e  outros problemas  – como o retraimento, por exemplo, quadro caracterizado por lembrar sintomas de uma depressão. A pesquisadora também estende seu trabalho aos pais das crianças com autismo, pois há uma série de análises que mostram que eles têm maior propensão a desenvolver transtornos mentais – tais como depressão, estresse e ansiedade – do que pais de crianças sem autismo.

Atualmente, os distúrbios relacionados ao autismo são denominados como Transtornos do Espectro do Autismo (TEA) e incluem uma gama de manifestações da doença. Dentro do espectro, é possível encontrar desde crianças com grave comprometimento cognitivo, até crianças com a cognição muito preservada. Para realizar o diagnóstico e atestar a presença do problema há três eixos que precisam ser avaliados: dificuldade de  interação da criança com outras pessoas, sejam elas próximas ou não; comunicação confusa e que apresente um esforço maior do que o comum e frequência de comportamentos repetitivos – balanceio do corpo e uso de objetos para funções que não sejam a sua são exemplos.

De acordo com Júlia Durand, a predisposição de bebês irmãos de crianças com autismo a desenvolverem a doença, ou outros problemas, é explicada por dois fatores: o primeiro é a presença de uma herança compartilhada, uma vez que as crianças possuem alguns genes em comum com seus irmãos; o segundo atribui a doença a problemas do neurodesenvolvimento – sendo que um fator é somado ao outro. Júlia diz que entender este segundo motivo é muito importante, porque o sistema nervoso tem uma neuroplasticidade maior entre bebês, o que otimiza tratamentos, dado que essa plasticidade diminui ao longo do tempo. “Durante os três primeiros anos de vida, a criança é mais suscetível a ter mudanças no seu funcionamento neuronal, pois o seu sistema nervoso ainda está muito aberto, de modo a facilitar intervenções do ambiente”, esclarece.

Já os problemas que os pais de crianças autistas desenvolvem são atribuídos a uma série de razões, conta a pesquisadora. Uma delas pode ser entendida como uma ferida narcísica, visto que o pai terá que lidar com o fato de seu filho ter algumas limitações. “É muito comum escutar pais falando coisas como ‘eu não sei o que será do meu filho quando ele crescer’ ou ‘eu acho que ele será uma pessoa muito dependente’, e todas essas qualificações podem fazer com que a criança sinta um fardo muito decepcionante para si própria”, afirma.

Outro caso bastante comum é encontrar mães que se culpam pela doença do filho, relata Júlia: “muitas mães se responsabilizam pela situação de seus filhos por acharem que fizeram algo para desencadeá-la, por essa razão, temos um trabalho para ajudá-las a sair deste lugar de culpa e mostrar que elas também são limitadas em relação ao que podem definir quanto a eles”. Júlia destaca que devido aos problemas que seus pais podem desenvolver, crianças irmãs de autistas já terão uma situação de parentalidade mais difícil, o que pode acarretar impactos no seu desenvolvimento e torná-las mais vulneráveis.

Percurso da pesquisa

O delineamento metodológico usado na pesquisa é caracterizado como um estudo de caso controle, no qual foram comparados 60 quadros de crianças irmãs de autistas, com 60 de crianças irmãs de não-autistas. Um fator importante foi garantir que esses grupos fossem homogêneos quanto à escolaridade materna e idade e sexo do bebê, pois essas são variáveis importantes para associar aspectos do desenvolvimento, explica a pesquisadora. “Nós sabemos, por exemplo, que uma mãe mais escolarizada tem maior acesso a serviços de saúde e possibilidades de incentivar a criança cognitivamente, logo garantir a homogeneidade dos grupos nos dá maior respaldo para fazer afirmações sobre os quadros analisados.

Para realizar as avaliações foram usadas diversas escalas que levaram em conta pontos como a saúde mental materna, verificando sintomas de depressão, ansiedade e estresse percebido – frequência em que a mãe notam que estão em situações de estresse; interação da mãe com o bebê; sinais de sofrimento na criança e interação do bebê com o pesquisador. Em um segundo momento, foram consideradas quais características variaram com o tempo, sendo observados quadros em que ocorrerão melhoras e outros em que a situação não se alterou. Segundo Júlia Durand, os principais avanços estão relacionados a um maior engajamento do bebê em tentar manter contato com as outras pessoas. Além disso, o trabalho depositou esforços em resgatar as crianças do isolamento ao qual se empunham e aproximá-las afetivamente dos pais.

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