Vinicius Campos, ator e escritor, conta como desfrutar da vida em família, mesmo em dias difíceis
Vinicius Campos* Publicado em 21/05/2021, às 10h09
Depois do jantar lembro que ainda não escrevi a coluna desta sexta-feira. Hoje gravei o dia todo, nos intervalos, dentro do camarim, me escondendo de meus companheiros, possíveis transmissores desse vírus horrível, tentei dar conta de outros compromissos. Projetos, amigos, família. O meu filho do meio fez um exame. "Foi incômodo", me disse por mensagem. Enfiaram uma câmera pelo nariz goela abaixo. Coitado. "Teu pai te mimou?", pergunto eu. E ele me responde: "Me comprou um ChocoChips no Starbucks". Pro meu filho, mimo é que lhe comprem algo, penso. Sinto ternura. "Vini, no estúdio", gritam. E volto eu ao personagem.
A tarde inteira respeitando marcações, repetindo textos. O celular no camarim. Longe. A concentração é fundamental. Termina o dia. Tiro a maquiagem. Colocou minha roupa de frio e entro num carro que em meia hora me deixa na porta de casa. Os meninos em seus quartos, imersos em alguma tela, o marido fazendo aula de yoga virtual, e eu, me sento na varanda, e resolvo as últimas pendências. Respondo os emails mais importantes.
Toca o telefone. Entrevista para um portal. A jovem e simpática jornalista me pergunta sobre o que amo. Meu cansaço desaparece e sou contagiado pela possibilidade de levar adiante o que penso. Ela, uma menina, me escuta e acho que me entende. Talvez em vinte anos entenda muito mais. Porque é o natural, o processo que temos que atravessar.
Na cozinha, o Edu, incrível como sempre me espera com um banquete. Comida caseira simples feita com amor. Coloco música. "Don't worry, be happy". Bailo. Dançamos. Chega um filho. Dança. Chega o outro. Não quer dançar. "Podíamos fazer um vídeo dançando essa música e subir no instagram", proponho. Eles reagem como se eu fosse um velho ridículo. Sou um velho ridículo?
A conversa corre solta. Falamos do dia. Das experiências. Do que foi bom, daquilo que não. E meu pequeno pega a gata no colo. A gata quer sair. Ele não deixa. Eu falo pra ele soltar. Ele fica bravo. Diz que sou um chato e desce pro quarto sem dizer boa noite.
Antes, quando isso acontecia, eu ia pro meu quarto, e pensava: que dia difícil. Melhor ficar um tempo longe do meu filho até que ele pense no que fez e entenda que foi estúpido e que eu sou o melhor pai do mundo. E agora, depois de seis anos sendo pai, entendi que o que nunca devo deixar acontecer é que essa discussão boba dure uma noite inteira, porque no dia seguinte ela terá crescido e aos poucos irá se transformando num monstro invisível que vai dar um tom escuro ao nosso amor.
Agora, quando isso acontece. Hoje, minutos atrás, quando isso aconteceu, respirei fundo, fui até o quarto dos meus filhos, e dei-lhes um beijo cheio de amor. Não importa quem tem a razão, quem a perdeu, o que aconteceu, só importa que eles e eu, que nós possamos dormir tranquilos, sabendo que no quarto ao lado mora alguém que nos ama profundamente.
E de repente, o compromisso de ter que escrever uma coluna se tornou prazeroso e emocionante. Brindo por você mãe e pai que trabalha o dia inteiro, que dá um duro danado, que têm dias muito mais difíceis que os meus, e que sempre encontra um momentinho pra dar um beijo naqueles que você ama. Beije aqueles que você ama.
Até sexta que vem.