Vinicius Campos, ator e colunista do Papo de Mãe, manda um recado para a apresentadora Patrícia Abravanel: "o amor é tão natural que não precisa ser explicado"
Vinicius Campos* Publicado em 04/06/2021, às 11h43
Acabo de jantar com meu marido e meus filhos. Falamos de trabalho, escola, projetos, objetivos, férias. Elogiamos a comida que o Edu fez, brindamos por suas conquistas no trabalho. Vimos um pouco da partida Argentina x Chile. Os meninos nos contaram sobre a escola, nos lembramos de viagens que fizemos juntos, eles discutiram pra ver quem ia até a churrasqueira pegar mais frango.
"Preciso escrever minha coluna" - disse e vim pro quarto.
No caminho, tentando definir que palavras colocaria aqui, pensei na Patrícia Abravanel e sua fala pouco empática sobre a comunidade LGBTQIA+.
Confesso que fui no "google" ver bem a sigla por medo de errar e dar papelão por mais que esteja convencido que o que menos importa é o significado das letras. Minha avó nunca soube sigla nenhuma, mas sua atitude sempre foi de amor, respeito e empatia.
Teve uma frase da apresentadora, conservadora, casada com um ministro de Bolsonaro, que me chamou a atenção. Ela disse que era difícil explicar o nosso amor às crianças, o amor gay, o amor da comunidade formada por cada uma das identidades representadas nessa longa sigla.
Quando o Edu e eu conhecemos nossos filhos eles moravam num abrigo. Depois de algumas visitas chegou a inevitável pergunta. Queriam saber qual ligação havia entre nós. Primos? Irmãos? Amigos?
Depois de inúmeras tentativas revelei: maridos. O Edu e eu somos maridos.
-Isso quer dizer que vocês se beijam na boca?
-Exato. Nos beijamos na boca.
E os três falaram de forma rítmica: "Se beijam na boca, se beijam na boca."
Foi tudo. Tudo o que eles precisavam saber, tudo o que precisavam dizer.
Querida Patrícia, o amor é tão natural que não precisa ser explicado. É como ter fome, respirar. Amor é necessidade vital. As crianças o entendem, o percebem, o emitem. O que criança não entende é violência, desrespeito, ódio. Porque são conceitos impostos por sociedades conservadoras, ou religiões que não foram capazes de entender a verdadeira palavra da Bíblia.
Minha avó, uma senhora muito católica, quando eu disse que tinha medo de lhe contar que era gay porque sabia que para ela a religião era muito importante, ela me disse: "Te aceito justamente porque sou católica, foi na igreja que aprendi a amar ao próximo como a mim mesma".
Talvez, Patrícia, você se surpreenda quando eu te diga que voinha só estudou até a quarta série primária. Que se casou aos 16 anos, pariu treze filhos, e nunca saiu do sertão do nordeste, onde nasceu, educou seus filhos, foi uma vizinha amada e respeitada por sua índole, e faleceu sem nunca ter entrado num avião, nem mesmo num elevador.
Enfim, mães e pais que por acaso estejam lendo este texto, fiquem tranquilos! Não há amor no mundo que possa fazer mal. Protejamos nossos filhos da hipocrisia, do preconceito, do bullying, porque esses sim trazem consequências dolorosas aos nossos pequenos. Se queremos formar cidadãos livres, felizes e seguros, precisamos de amor, de todo tipo de amor, de respeito, de empatia. Posso garantir que meus filhos, criados por dois homens gays, carregam em seus olhos a tranquilidade de quem desde pequeno entendeu que não existe amor errado. E assim conquistaram a liberdade para amar a quem quiserem, e a segurança para respeitar e abraçar aqueles que sejam diferentes deles.
Até a próxima sexta. Sempre uma delícia bater esse papo com vocês.
#DiversidadeComeçaNaInfância