pmadmin Publicado em 28/05/2012, às 00h00 - Atualizado em 19/09/2014, às 19h33
Durante nossa conversa comecei a sentir fortes dores, e pedi licença para ir ao banheiro. Ele também já estava de saída, pois atenderia em outro local, mas disse que era pra procurá-lo no dia seguinte no hospital em que estaria. Continuei trabalhando, pois a dra Martha Sperandio ainda estava em atendimento. Continuei, com muitas dores, e muitas idas ao banheiro, e se quer conseguia sentar. Por fim não tinha mais urina, mas sim, eu estava tendo um sangramento uretral, saía coágulos de sangue ao invés de urina. Assim que acabou o expediente, a doutora me levou ao hospital e pediu que fosse feita uma medicação em mim, e que me levaria ao hospital militar, onde já fui dependente, para me internar. Como a dor havia passado, após a medicação, eu disse que não seria necessária a internação. Ela me deixou em casa, e a partir desse dia, as coisas pioraram. Bebo muita água diariamente, mas desde que recebi a medicação, eu não urinei mais. Dormi até determinada hora. Mas quando foi 2h da manhã, o meu tormento começou. Estava com uma bexiga muito inchada, e chorando por querer urinar, mas não conseguia. As 5h, minha mãe acordou com meu choro e ela me levou ao hospital militar, onde o dr. Robson dava expediente. Fui deitada no banco de trás do carro. A dor era tanta que não conseguia se quer sentar. Ao chegar lá, o dr. foi ao meu encontro no pronto-socorro, e disse que iria me deixar no soro para ver se eu urinava. Foi quando pedi para que ele não me injetasse líquido, mas que passasse uma sonda. Foram retiradas mais de quatro cubas de hematúria (nota da editora: presença de sangue na urina).
Eu já estava anêmica e com distúrbio de coagulação, o qual me impedia de fazer uma cistoscopia (nota da editora: exame endoscópio das vias urinárias baixas. É realizado com o cistoscópio (nota da editora: aparelho que possui ótica que visualiza o interior da bexiga, uretra e ureteres), pois, eu poderia ter uma hemorragia violenta na hora desse exame. Permaneci internada para realizar exames: ultrassom das vias urinárias e o endovaginal, o qual senti dores horríveis. Com isso, o médico me avisou de que poderia ser endometriose, pois estava tudo aderido ao canal vaginal, mas nada de descobrir o que estava realmente acontecendo com meu corpo. Segui internada e foi pedida uma tomografia. Nela foi visto uma massa entre meu útero e minha bexiga. Nesse momento, os médicos passaram a suspeitar de um carcinoma (câncer), e me informaram sobre essa suspeita. Pediram uma ressonância magnética onde foi constatada essa massa, que já estava com infiltração no ureter esquerdo, na bexiga e entre o sigmoide e o reto. Voltei para casa após 10 dias de internação e usando a sonda vesical. Continuei fazendo mais exames, entre eles, a colonoscopia, que mostrou que não havia invasão interna no intestino. Fiz a cistoscopia quando melhorou minha coagulação sanguínea. Essa primeira foi só pra visualizar. Repeti o exame outra vez para fazer a biópsia, a qual confirmou a presença do tecido do endométrio na bexiga. Mais uma vez fui para casa de sonda. Comecei então o tratamento com zoladex. Fiz aplicação de quatro doses associada ao uso de depo-provera (nota da editora: um contraceptivo hormonal à base de acetato de medroxiprogesterona injetável intramuscular, que a paciente toma a cada três meses), mas esse remédio não suspendeu minha menstruação. Após essas quatro doses parei com esse remédio e continuei o tratamento só com a depo, por mais uns oito meses. Os sangramentos continuaram. Comecei a conversar com meu ginecologista sobre uma histerectomia, a qual ele sempre foi contra, pois eu sofreria com uma menopausa precoce. E eu lá estava preocupada com uma menopausa precoce? Minha preocupação era com a minha função renal, que estava cada vez menor a cada cintilografia feita (nota da editora: exame de imagem que difere do raio-x e do ultrassom, pois seu principal objetivo é avaliar o funcionamento interno dos órgãos, e não apenas a morfologia desses órgãos. É mais indicado em caso de tumores com altas chances de metástase, grandes traumas, entre outras doenças). Comecei a ir a outros ginecologistas. Uma, inclusive, disse-me que o tratamento estava correto. Já o outro disse que ninguém mandava presente pra ele, que só mandavam bomba, e que era pra eu voltar depois de dois meses, pois eu já tinha feito uma cirurgia bariátrica (nota da editora: cirurgia para a redução do estômago) recentemente e que iria ver o que poderia fazer no meu caso.
Sai de lá indignada com os descasos desses profissionais. Mas um urologista, que é amigo do dr. Robson Canhamaque, o médico com o qual trabalhava e que me acompanhava, foi enfático em dizer que seria necessária uma cirurgia ginecológica e outra urológica. Enquanto isso, o problema persistia. Com o início do tratamento, eu seguia sem dor, mas com sangramento constante. Isso prejudicava muito minhas vias urinárias. Voltei ao ginecologista que me acompanhava, mudei o depo-proverona para o anticoncepcional cerazete. Essa troca não resultou em nada. Passei a comprar medicação por minha conta, na esperança de cortar o sangramento. Consegui isso por dois meses usando o mesigyna (nota da editora: contraceptivo hormonal injetável intramuscular à base de enantato de noretisterona e valerato de estradiol, que se toma mensalmente), mas ele não era o hormônio ideal. A essa altura, havia passado meses sem fazer a cintilografia, e foi quando comecei a sentir forte incômodo ao urinar. E bem nessa época, o urologista dr. Marcelo Zouain, que me atendia, entrou de licença médica, mas fui me consultar com um uro de sua equipe, que solicitou o pedido do exame. Neste momento, ele informou que meu rim não tinha mais jeito, e que só não o retiraria porque não iria me abrir somente para isso. Mas se eu precisasse de uma cirurgia ginecológica, eles retirariam o rim. Sai do consultório pensativa, e, de repente, eu estava em lágrimas. Em três anos de tratamento, e com tantos descasos, nunca tinha derramado uma lágrima em relação ao meu problema, pois sempre tive muita fé e força pra enfrentar esse inimigo que morava dentro de mim. Mas neste dia, o meu mundo desabou. Mesmo assim não deixei me abalar. Não sou o tipo de pessoa que toma a doença para si e a carrega nas costas. Eu a deixo ali no cantinho, e fico observando. Sou positiva e tento todas as possibilidades, e sempre sem deixar a tristeza tomar conta de mim . Voltei ao ginecologista e o avisei que estava cansada deste tratamento, de me entupir com esses hormônios, e que tudo foi em vão. Nesse momento, eu estava sangrando há mais de seis meses, já estava com a pele irritada de tanto usar protetores e literalmente irritada com tudo que estava acontecendo. Então, ele me deu a última solução, usar o mirena (nota da editora: dispositivo intrauterino). O plano liberou a colocação do meu DIU, sem problemas algum, e, no dia 23 de agosto de 2011, eu me internei para colocá-lo. A única vantagem do DIU em meu corpo foi o fato de ele ter regulado a minha menstruação, que passou a vir rigorosamente de 30 em 30 dias. Porém, o incômodo urinário aumentou.
Por conta disso, voltei ao consultório do dr. Marcelo Zouain, que disse-me que eu não poderia continuar assim, e que iria conversar com um amigo ginecologista, para ver se ele faria a parte ginecológica da minha cirurgia. Ele topou, e, em mens de 15 dias já tinha feito todos os exames pré-operatórios. A Unimed liberou na mesma hora, e então, minha cirurgia foi marcada sem ao menos eu passar por consulta com o ginecologista, amigo do meu médico. Imagino que alguém deve pensar que sou louca por ter feito uma cirurgia com um médico que não conhecia. Confiei e confio plenamente em meu uro, que abraçou minha causa, já que, até então, fui a vários ginecologistas e nenhum se preocupou com meu problema. E, no dia 30 de janeiro de 2012, fui para o centro cirúrgico ao meio-dia. Foram mais de sete horas de cirurgia. Saí da sala de cirurgia para a UTI às 22h. Tive hipotensão (nota da editora: pressão arterial baixa), por ter perdido muito sangue. Lembro-me quando o uro chegou perto de mim, e perguntou se estava tudo bem comigo. Ainda sonolenta, perguntei:” Como é que estava a situação dr.?” E ele respondeu: “ Pior do que eu imaginava. Senti que estava no limite das tentativas terapêuticas e que aquela hora era a hora.” E era mesmo. Hoje me recupero bem da histerectomia (nota da editora: retirada do útero), reimplante de ureter esquerdo, cateter no rim direito, retirada de parte da bexiga e do ovário direito. O ginecologista poupou o ovário esquerdo, para não ter sérios efeitos da menopausa, já que sou muito nova. Vamos bloquear a função desse ovário com hormônio. O importante é que sinto-me bem e sem dores cirúrgica. Voltei para casa de sonda, a qual apelidei carinhosamente de Totó, já que andava comigo pra cima e pra baixo 24 horas por dia, e que retirei três semanas após a cirurgia. Agora minha esperança está renovada, pois não estou mais condenada a uma hemodiálise, ou até mesmo a um transplante renal. Espero que minha história sirva de exemplo e ajude outras mulheres a perceberem os sintomas da endometriose, e que não esperem muito tempo pra buscar ajuda. E, que, principalmente, corra dos profissionais que nos tratam com tanto descaso em relação aos sintomas dessa doença, mas que vá em busca de outros. E que todas às mulheres que ainda sofrem com esse problema, e que venham ler minha postagem, digo para ter sempre consigo duas palavras, que foram primordiais em minha vida: FÉ e FORÇA. Foram nelas que me apeguei e hoje me sinto uma vencedora, mesmo após ter sido mutilada. O importante mesmo é que estou VIVA, graças a Deus!” Beijos com carinho! Daniele Balbino
Daniele Balbino e sua filha. |