pmadmin Publicado em 01/10/2012, às 00h00 - Atualizado em 26/09/2014, às 17h44
Por Blenda de Oliveira*
Um dia estava caminhando na praia e vi uma cena interessante. Uma criança aprendia a andar de bicicleta e animadamente pedia a sua mãe que tirasse as duas rodinhas extras que lhe forneciam uma certa segurança. Insistia dizendo: “mamãe eu já sei andar sozinha, por favor!!! A mãe se recusava a dar um voto de confiança e repetia que ainda precisava de mais tempo e que era perigoso, podia cair. A menininha muito esperta respondeu: “mas se eu não cair não consigo aprender!” Bingo, garota!
É verdade, se não cair não poderá aprender sobre os cuidados necessários e, mais ainda, não aprenderá sobre sua própria força. Pais sob o manto do amor e a intenção de impedir que seus filhos sofram, fazem toda a sorte de coisas para protegê-los, inclusive, tomam providências que mais acalmam seus próprios medos que propriamente são uma necessidade real da criança.
Pois é, quase sempre são os pais que sofrem com o crescimento dos filhos. O que é mais intrigante é a luta que se trava com o que há de mais natural, crescer! Então, alguns pais impedem que seus filhos durmam em seus quartos, responsabilizem–se pelas tarefas da escola, arrumem seus brinquedos ou comam por sua conta. Estamos aqui nos referindo às crianças que estão em perfeita saúde e já não são mais bebês.
Uma coisa é uma criança ter seu crescimento forçado, sendo quase obrigada a abandonar as fases próprias da infância e se tornar uma adolescente, fora do tempo previsto, outra coisa é valorizar pequenas oportunidades, próprias de cada idade, para que a criança experimente devagar o sabor da autonomia.
Processos que adiantam o desenvolvimento – conhecidos como adultização da infância – têm sido observados nos dias de hoje, principalmente, com o acesso fácil e rápido com que crianças e adolescentes têm a quase todo tipo de conteúdo. Além disso, vivemos em tempos de resultados, performances e competitividade, logo tudo precisa acontecer muito rápido. Os processos, o tempo que cada aspecto do desenvolvimento necessita para amadurecer, são apressados. O desempenho das crianças é observado e avaliado em rápido ou lento, esquecendo-se que cada um tem seu próprio ritmo.
A criança do nosso exemplo demonstra que seu ritmo está pedindo uma chance, mas sua mãe, por razões pessoais, mais que da criança, prefere deixar adiada a oportunidade da experiência de crescer um pouquinho.
Entretanto, o que observamos é que por trás da maneira como cada pai ou mãe educa seu filho, há crenças importantes. Alguns acreditam que amar os filhos significa que eles devam permanecer dependentes da estrutura familiar. A tal família unida para eternidade pode se converter num lugar pouco fértil ao crescimento e descoberta da independência.
Podemos dizer que quando tudo vai razoavelmente bem na educação, os filhos buscam seus espaços, fazem suas escolhas e continuamente se responsabilizam por cada conquista. Bons pais se tornam desnecessários, bons pais toleram, por vezes, frustrar seus filhos e acreditam que o melhor ensinamento é a crença em si mesmo, por isso topam tirar as rodinhas da bicicleta, ou permitem que sua filha escolha a cor do vestido que quer usar.
Quando pais aceleram o crescimento dos filhos ou o lentificam é importante que reflita sobre suas vidas, seus projetos e suas frustrações. Manter filhos superprotegidos e excessivamente assessorados pode significar um enorme vazio na vida desses pais, seja na vida conjugal ou pessoal. Assim, precisam da dependência prolongada porque assim prolongam suas tarefas como pai ou mãe. O contrário é verdadeiro. Há pais que não suportam cuidar da infância e se apressam em exigir dos filhos que cresçam rápido, se cuidem por conta e mostrem resultado.
Crescimento precisa ser entendido como um processo da natureza e com muitas vantagens. Crescer ou não crescer, não se trata de uma escolha, é uma condição que, faça o que fizer, ou deixe de fazer, o tempo passa e a vida sempre irá requerer novas habilidades para os novos desafios. A criança que não puder ser alimentada e ensinada a crescer sofrerá perdas importantes e terá que fazer maiores esforços para dar conta das naturais demandas do viver.
* Blenda de Oliveira é Psicóloga Clínica formada pela PUC-SP, Psicanalista pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP) e psicoterapeuta de adultos, adolescentes, crianças, famílias e casais. Participou como especialista convidada do Papo de Mãe sobre “deixar o filho crescer”, exibido em 30.09.2012.