Futebol não é esporte para mulheres

Quando futebol é desculpa para cometer violência doméstica. Mais uma triste realidade em relação às mulheres no nosso país

Nathalie Malveiro* Publicado em 31/05/2022, às 06h00

Futebol: um risco para as mulheres? -

Levantamento feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com o Instituto Avon constatou que os registros de ameaças contra mulheres aumentaram em até 50% nos dias de partidas do Campeonato Brasileiro de Futebol no período de 2015 a 2018.

Resultado parecido já havia sido constatado em dias de jogos da seleção inglesa durante a Copa do Mundo de 2010. Lá, em dias de jogos do time inglês, as agressões domésticas contra a mulher subiam em média 30%, independente de vitória ou derrota.

Infelizmente a conclusão a que se chega é que futebol não é um bom esporte para mulheres.

Mas se o esporte não é uma boa, que tal relaxar em uma happy hour?

Também não é uma boa ideia. Pesquisa realizada por uma famosa marca de whisky apontou que 66% das mulheres já sofreram algum tipo de importunação em um bar, restaurante ou balada. Desde a abordagem grosseira, até toques e dizeres ofensivos.

Melhor ficar em casa

Mas como dizem os jovens, só que não!

A cada hora, 30 mulheres são agredidas fisicamente. A cada 7 horas uma mulher morre vítima de feminicídio. Durante o período mais crítico da pandemia de covid-19 (março de 2020 a dezembro de 2021) mais de 100 mil mulheres e meninas foram vítimas de abusos sexuais. E a absoluta maioria destas variadas agressões ocorreram no interior da casa, local em que deveríamos nos sentir mais protegidas.

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O fato é que não importa o porquê, se o time dele ganhou, se perdeu, se jogou, se ele bebeu, se perdeu o emprego, se estava nervoso com a situação financeira, seremos o alvo da raiva masculina.

Isto porque as situações mencionadas são “gatilhos” para os homens, são situações que desencadeiam neles a reação violenta. Mas não se engane, a violência já estava lá, só se mostrou agora.

Um dos grandes desafios no enfrentamento à violência doméstica é fazer com que a vítima se reconheça como vítima. Por viver anos em situação de estresse, a mulher vítima de violência acaba minimizando os riscos até o momento em que não mais enxerga que está em uma situação de perigo e risco de vida.

Esse estresse se revela naquela ansiedade momentos antes do marido ou companheiro chegar em casa. Será que está tudo arrumado como ele gosta? Será que as crianças irão fazer barulho na hora do programa favorito dele? Será que não houve problemas com o chefe e o colega de trabalho? E por aí vai.

São questões que fogem ao nosso controle e pelas quais não temos que “pagar”.

Aceitar e justificar a irritação do marido porque o time perdeu e aceitar as pequenas violências – as palavras atravessadas, as ofensas e ridicularizações, a manipulação atribuindo a nós a culpa pelas insatisfações dele – além de poderem configurar violência psicológica, podem levar às agressões físicas mais graves.

Então, logo nos primeiros sinais de violência (controle, ofensas, ameaças e embates físicos), procure ajuda para que os dias de jogos de futebol sejam dias em que nós mulheres só tenhamos que nos preocupar se nosso time fará gols, nosso goleiro fará grandes defesas e que a raiva seja descontada no juiz (que sempre “rouba” para o time contrário)!

Onde procurar ajuda

A promotora de Justiça Nathalie Malveiro. Foto: Avener Prado/BuzzFeed News

*Nathalie Malveiro é Promotora de Justiça do Enfrentamento à Violência Doméstica, Assessora da CGMP-SP, com especialização em Vitimologia pela IUC - Inter University Centre Dubrovnik e Bacharel em direito pela FADUSP

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