Quando nos vemos diante de uma pandemia que trouxe mais dificuldades para a Educação, falar em inclusão se tornou ainda mais complexo
Wania Emerich Burmester* Publicado em 02/04/2021, às 00h00 - Atualizado às 09h42
A educação de crianças com necessidades especiais, transtornos do desenvolvimento ou dificuldades de aprendizagem sempre foi um enorme desafio, tanto para escola e os educadores, quanto para os pais e para os próprios alunos em questão.
Essa dificuldade talvez tenha a ver com o fato de que nossa sociedade valoriza a cultura da padronização e seletividade, restringindo o espaço para as singularidades e necessidades individuais. Quando nos vemos diante de uma pandemia que trouxe ainda mais desafios e dificuldades para a Educação, falar em inclusão dentro deste cenário se tornou ainda mais complexo. A inclusão em diferentes níveis e setores de uma sociedade, incluindo aí um dos mais essenciais – a Educação, é o que vai determinar o futuro e a vida do indivíduo com alguma necessidade especial.
O Abril Azul, campanha realizada todo mês de abril para promover a conscientização sobre o autismo, certamente vai trazer visibilidade para o tema neste período e precisamos então aproveitar o momento para gerar reflexão e ação no sentido de uma sociedade cada vez mais inclusiva, mesmo diante de desafios como a pandemia.
Manter a concentração durante as aulas remotas é um desafio para a maior parte dos estudantes, de qualquer idade e em qualquer nível escolar. Mas, para alunos com necessidades especiais, a experiência de só ter contato com os professores e colegas por meio de uma tela de computador é ainda mais difícil. No caso de alunos com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA), existem inúmeras questões que surgem quando se coloca um aluno autista para aprender por meio do ensino remoto: o autista consegue permanecer em frente a uma tela e se concentrar para absorver o conteúdo? Por quanto tempo isso é possível? Há que se considerar também as dificuldades na comunicação virtual, não apenas no que diz respeito ao aluno entender o que é dito, mas também no sentido dele se fazer entendido.
Por maior que seja a preocupação de escolas e educadores em adaptar a realidade atual para que o ensino remoto também seja inclusivo aos autistas, é preciso levar em conta que o isolamento e a suspensão das aulas presenciais afetam uma das principais premissas da inclusão deste tipo de público, que é a socialização. Quando um aluno autista entra na escola, a socialização é um dos principais objetivos desse processo. A interação e a comunicação com o outro podem se tornar grandes desafios. O ensino remoto para esse aluno vai exigir estratégias personalizadas, um olhar diferente para a aula que está sendo oferecida para ele. O professor precisa aplicar uma metodologia, expressão facial e corporal específicas para se conectar a esse aluno.
A integração família escola é muito importante no processo de aprendizagem que também tem como finalidade a interação com os demais colegas da turma em atividades cotidianas, que lhe permitirão a socialização tão fundamental para seu processo de inclusão social. Abraçar a causa da educação inclusiva – com ou sem pandemia – é trabalhar diariamente para quebrar as barreiras que sempre se apresentam pelo caminho. Escola e educadores precisam buscar alternativas que garantam àqueles com necessidades especiais as adaptações necessárias para viabilizar o aprendizado, mas sem deixar de lado uma questão importante: o aluno precisa estar inserido no mesmo contexto dos demais, sem que tais adaptações acabem por excluí-lo do meio ao qual deve pertencer. Sem essa condição, a inclusão não acontece de fato.
Não podemos apartar um aluno de seu grupo apenas porque para ele a aula virtual é mais difícil. Quem sabe criar momentos, mesmo que curtos, de interação com pequenos grupos? Os professores podem sugerir que uma vez por semana um grupo se reúna, virtualmente, para conversar e trocar ideias sobre algum tema das aulas ou sobre assuntos que possam chamar a atenção dos alunos. Dessa forma, o aluno com TEA, ou outra necessidade, tem a oportunidade de interagir, ouvindo e participando.
Outra estratégia pedagógica seria agendar um momento individual do aluno com o professor, para que possa haver uma comunicação mais dirigida para esta criança ou jovem, visando as expressões faciais, a fala personalizada e até a comunicação não verbal, estratégias tão importantes quando se trata de estabelecer o vínculo com o aluno autista e a adequação do conteúdo para a realidade individual. É certo que o nível de autismo e as formas de manifestação do transtorno em cada aluno também vão determinar o grau de complexidade do processo de inclusão, sendo, por isso mesmo, necessário lançar um olhar individualizado sobre cada caso.
O que não se pode é incorrer no erro da padronização ou da acomodação.
*Wania Emerich Burmester é consultora pedagógica do Sistema Positivo de Ensino.