Hoje, anos depois, marica resolvida e assumida, graças a muita terapia, a muita leitura e muita arte, marica passou a ser elogio, e macho a pior das ofensas.
Roberta Manreza Publicado em 13/11/2020, às 00h00 - Atualizado às 18h34
Por Vinicius Campos.
Hoje, marica passou a ser elogio, e macho a pior das ofensas.
Cresci escutando ofensas como “marica”, “viadinho”, “mulherzinha”. Naquela época eu acreditava que eram ofensas. Me sentia mal, chorava, e não encontrava nos adultos a proteção necessária.
Com o tempo fui entendendo que sofria esse tipo de “xingamento” quando meu comportamento era considerado feminino. Se chorava, se dançava, se me expressava com mais delicadeza.
Ser parecido a uma mulher estava mal visto. Os sinais eram claros, eu devia me distanciar delas, tinha que aprender a falar grosso, a resolver desavenças na porrada, a jogar futebol sem me importar se numa dividida acabava machucando algum colega, a ter várias namoradas ao mesmo tempo, a sentar no metrô com as pernas abertas, a arrotar em público e coçar meu saco. Nem pensar em mostrar minhas fragilidades.
O mundo valorizava e ainda valoriza os machos.
Hoje, anos depois, marica resolvida e assumida, graças a muita terapia, a muita leitura e muita arte, marica passou a ser elogio, e macho a pior das ofensas.
Por que?
Simples.
Mais de noventa e cinco por cento da violência no mundo é cometida por machos. São os machos que matam milhares de mulheres todos os meses, são os machos que ignoram a ciência, que não sabem exercitar a empatia, que são pais distantes, que não encontram no diálogo a possibilidade do entendimento.
O Brasil está sendo governado por uma das piores espécies, um macho básico, sem empatia, sem a consciência do peso da morte, sem a preocupação por aqueles que mais precisam. No dia em que o nosso país seja uma nação de maricas, tenho certeza que estaremos muito melhor.
E pra isso é que educamos os nossos filhos. Pra que eles se conectem com seus sentimentos, sejam livres para amar e respeitar, sejam cidadãos empáticos e não violentos. Não permitamos que nossos filhos cresçam pensando que macho é um adjetivo positivo e marica negativo, porque pra nossa sorte o macho é um ser em extinção num mundo cada vez mais aberto ao amor.
Já morreram mais de cento e sessenta mil pessoas por um vírus arrasador. Só um macho tão básico como o presidente Bolsonaro pra não perceber tanto sofrimento.