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A burguesia fede: há futuro possível sem comida e escola?

"Como não se revoltar com uma sociedade que não educa e alimenta suas crianças?", questiona Vinicius Campos, ator e escritor

Vinicius Campos* Publicado em 03/12/2021, às 09h19

244 mil crianças com idades entre 06 e 14 anos estão fora da escola no Brasil
244 mil crianças com idades entre 06 e 14 anos estão fora da escola no Brasil

O movimento Todos pela Educação divulgou nesta semana um levantamento que constata que 244 mil crianças com idades entre 06 e 14 anos estão fora da escola. Um aumento de 171,1% quando comparado com os números de 2019. Os números para jovens do ensino médio também são assustadores. Não preciso nem dizer que as crianças mais afetadas são as pretas e pobres. 

Assista à entrevista com a CEO da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal sobre Primeira Infância e o Mapa "Primeira Infância Primeiro".

Na minha coluna do dia 19 de novembro, falei sobre a fome. Somente 26% das crianças atendidas pelo SUS recebem três refeições diárias. As outras ficam com a barriga vazia. Talvez sejam as mesmas que deixaram a escola. Como estudar com fome?

Há futuro possível sem comida e escola?

O único que consigo ver é triste e perigoso.

Dia desses escutei um jornalista argentino dizendo que o que gera violência não é a pobreza, é a desigualdade. Concordo. Imagino essas crianças que não comem, que não estudam, imagino elas se tornando adultas, vendo carros caros e mansões nas cidades onde moram, imagino elas revoltadas. Como não se revoltar com uma sociedade que não educa e alimenta suas crianças? Como não se revoltar com a falta de oportunidade e humanidade?

E não me falem em meritocracia. Não é possível medir mérito quando alguns comem e outros não.

Enquanto parte da população luta diariamente pra tentar levar comida pra mesa, vejo a burguesia preocupada com os números da bolsa, com o valor do dólar. Vejo a burguesia correndo para juntar dinheiro pra pagar a escola mais cara do bairro, dinheiro para as férias inesquecíveis, dinheiro para o carro do ano, pra melhor casa, pra fazer investimento, pra garantir um futuro digno e tranquilo. Burguesia da qual sou parte e me dá vergonha de ser. Burguesia que precisa acordar e entender que chega de acumular, que está mais do que na hora de dividir, de compartilhar. O que gera a violência é a desigualdade.

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Ano que vem tem eleições. Vamos escutar candidatos discutindo na TV, participando de debates (pelo menos aqueles que têm vergonha na cara), dando entrevistas e falando de economia, de corrupção, de petróleo. Quantos falarão sobre a fome e as crianças que estão fora da escola? Quantos apresentarão soluções plausíveis para aquilo que de fato faz a diferença na vida das pessoas?

E você, eleitor? Vai votar pensando no seu bolso ou tentar encontrar um projeto de país que coloque comida na mesa do pobre e leve nossas crianças de volta à escola? Você vai priorizar políticas que te permitam investir na bolsa ou aquelas que constroem moradia para quem vive nas ruas?

Porque temos duas opções: ou cuidamos da nossa gente e lhes damos uma vida digna através de políticas públicas potentes e transformadoras, ou teremos que viver para sempre dentro de condomínios com muros altos, morrendo de medo daqueles que foram marginalizados e que lá fora, revoltados com razão, brigam por um pedaço de pão.

*Vinicius Campos, escritor e pai de 3 adolescentes – Colunista do Papo de Mãe.

Instagram: @viniciuscamposoficial

Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Papo de Mãe. 
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