Eles nascem totalmente dependentes e, com os anos, adquirem cada vez mais liberdade e confiança para se soltar: primeiro, algumas horas na casa dos avós, depois, a escola, e, mais tarde, um passeio com os primos… No período de férias, muitos pais não conseguem combinar o período de descanso no trabalho com o dos filhos. Então, surge a oportunidade de passar um tempo longe, o que implica em dormir fora de casa. Mas será que estão mesmo prontos? Como saber se é hora de permitir ou não? Como os pais se preparam para esse momento?
Não é nada fácil, mas faz parte do processo de amadurecimento de todos. É o que diz a psicóloga Vera Zimmermann, do Centro de Referência da Infância e Adolescência da Unifesp (SP). “Quando se trata de educar uma criança, a família tem a tarefa de equilibrar dois valores: o pertencimento e a individualização. O primeiro se dá por meio do vínculo. A criança deve saber e sentir que faz parte daquela família. O segundo é o desenvolvimento de sua própria personalidade e de suas características. É o que a deixa segura para explorar o mundo além dos pais. Quando o desejo dessa individualidade aparece, ela manifesta a vontade de descobrir e se aproximar de outras pessoas e de conhecer outros ambientes”, explica. Nessa hora, seu filho pode dar sinais de que está, sim, pronto para passar mais tempo longe de casa e até dormir fora.
De acordo com a psicóloga, esse processo acontece aos poucos. Os pais devem preparar os filhos para essas novas experiências, oferecendo liberdade gradualmente. Se a família criou um vínculo forte nos primeiros anos do bebê, chega a hora de mostrar que há outras pessoas em quem ele pode confiar: os avós, a babá, a professora. “É preciso encorajar esse movimento para criar a individualização, que é uma forma dele se conhecer e descobrir o mundo”, ressalta Vera. Embora não existam regras, se houver o equilíbrio, por volta dos 3 e 4 anos, eles podem manifestar a vontade de dormir na casa dos avós; aos 5 ou 6 anos já têm aquelas brincadeiras de noite do pijama e, por volta dos 7 ou 8, costumam estar mais seguros para dormir na casa de um amigo, mas isso varia de acordo com cada criança.
Um degrau de cada vez
O primeiro passo é conhecer seu filho e observar se ele está mesmo preparado, se passou bem por todas as etapas anteriores, se demonstra segurança e manifesta esse desejo. “Se a criança nunca dormiu nem na casa dos avós, que são mais próximos, é mais difícil ficar uma semana fora da cidade com a família de um amigo. O desenvolvimento é gradual”, explica Vera.
“Os pais também precisam conhecer bem as pessoas com quem o filho vai viajar, conversar antes, saber se a família que vai recebê-lo está disposta para apoiar a criança nesse grande passo, que é ficar longe dos pais”, aponta a especialista.
E se ele chorar à noite?
Esse é o maior medo dos pais, da criança e do adulto que vai recebê-la, mas é uma reação completamente normal. Os adultos devem se preparar para ampará-la nesse momento. “É uma dor que vem da separação. Eles sabem que os pais estão longe e no meio da noite bate aquela frustração. O importante é que o adulto – o avô, a avó, os tios, os pais do amigo ou da amiga – se disponha a consolar, conversar, abraçar e dizer que vai passar. Normalmente, atitudes assim resolvem a questão”, diz a especialista.
A não ser que ela fique extremamente triste e ansiosa, em um ponto que os adultos acreditem ser além da saudade apenas, levá-la de volta para a casa dos pais ou pedir que eles a busquem não é uma boa solução. “Isso pode trazer uma sensação de falha, de fracasso, já que não é o que ela queria fazer de verdade “, reforça Vera.
Mudança de hábito
Passar alguns dias fora de casa também significa mudar de rotina. Todos aqueles costumes que você instituiu a muito custo (hora de dormir, de brincar, de tomar banho, de comer e o que comer…) provavelmente não serão seguidos durante aquele período. Mas não se preocupe (e nada de entrar em conflito com os avós, parentes, amigos…). Isso é positivo para o crescimento. “Sair da rotina, nesse caso, faz parte do amadurecimento. Durante aquele período, a criança vai perceber que existem outras formas de viver e que naquela casa tudo acontece de uma maneira diferente, em comparação aos hábitos seguidos pelos seus pais. E vai aprender a se adaptar e esse novo ritmo”, comenta a psicóloga.
O seu desafio virá depois, na volta do seu filho para os hábitos da sua casa. É nessa hora que começam argumentos como: “Não quero dormir. Na casa da minha amiga podíamos ir para a cama mais tarde” ou “Os pais do meu amigo nos deixavam comer assistindo à TV”. De acordo com Vera, pai e mãe devem enfrentar o problema com firmeza e ensinar que cada casa tem suas próprias particularidades, regras e costumes. “Vale dizer que os pais do amigo também foram mais permissivos justamente porque era um período de férias e que, com a volta às aulas, eles também dormem mais cedo por lá”, exemplifica a médica.
Sim, seu filho está crescendo!
Chegar a essa nova etapa do desenvolvimento dos filhos não causa insegurança apenas nos filhos. Pais também ficam apreensivos e se perguntam o tempo todo se tomaram a decisão certa ao permitir que as crianças finalmente passem uma temporada longe deles. Por isso, antes de deixar ou não, é preciso observar a idade, o comportamento, o estilo e os gostos de cada um. É preciso ter cuidado e confiar no adulto que ficará responsável nesse período. Mais que isso: é preciso acreditar no seu filho e em sua capacidade de desenvolvimento. Por isso, resista ao impulso de telefonar a cada minuto para saber o que está acontecendo por lá. Ligar de vez em quando é saudável, mas o exagero tornará a situação desconfortável para todos – além de deixar o seu filho inseguro. Apesar do receio dos pais – um sentimento normal – é fundamental se esforçar para superar as dificuldades e permitir a experiência, que é um primeiro passo para a individualidade e para compreender que o mundo é muito maior do que a nossa própria casa.
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