Roberta Manreza Publicado em 12/08/2018, às 00h00 - Atualizado às 10h02
Por Ricardo Kotscho*, jornalista
Modéstia à parte, esse pior pai do mundo aí do título sou eu mesmo.
Calma, já vou explicar o motivo do meu orgulho.
Sou de uma geração de repórteres que não paravam em casa, viviam viajando pelo Brasil e pelo mundo.
Foi assim durante a maior parte da minha carreira, que já atravessou meio século.
Por anos seguidos, só parava em casa para trocar de roupa e de mala, mal tinha tempo para conversar com a mulher e minhas duas filhas.
Por isso, elas foram criadas pela mãe, a grande Marinha, que fez delas duas jovens senhoras vencedoras na vida pelas quais eu sinto o maior orgulho.
Eu também venci na vida, graças a Deus, mas perdi o mais importante: o convívio com as filhas durante a maior parte da minha carreira.
Se eu herdei os defeitos de meu pai, um boêmio inveterado, um sonhador sem freios, um maluco adorável, não passei isso para as filhas _ sorte delas.
Deus sabe o que faz…
Neste domingo, em que pais e filhos escrevem as coisas mais belas uns sobre os outros, eu me sinto um estranho no ninho.
Por isso, não mereço presentes. Sou pai, mas nunca fui como deveria.
Não fui pai de levar filhas pra escola, fazer lição com elas, buscar em festas, tudo era a mãe que fazia.
Quase não participei da grande obra que é a formação dos filhos, tarefa que a Marinha assumiu, como mãe e pai ao mesmo tempo.
Só agora, ao ver as coisas belas que as filhas fazem em seus ofícios, a jornalista e a cineasta, me vejo em alguns momentos, alguma coisa deixei para elas.
Em primeiro lugar, o caráter e o senso de justiça, que são muito fortes nas duas, e também nos seus filhos, meus cinco queridos netos.
Todo pai gostaria de ser um herói dos filhos, mas só tive esse sentimento uma vez na vida, faz muito tempo.
Estava no interior de Minas Gerais, fazendo uma reportagem para o programa Globo Rural, quando me lembrei que aquele domingo era o dia da primeira comunhão da minha filha mais velha, a jornalista Mariana Kotscho.
Para fazer a reportagem, demorou mais do que o previsto, e eu estava acompanhado de uma equipe que não tinha nada a ver com isso.
A chefia não poderia saber, mas eles me deram a maior força para dar uma fugida e ir à missa da minha filha.
Peguei um ônibus à noite, cheguei na igreja bem na hora, e depois fomos almoçar juntos com a família.
Ninguém ficou sabendo disso na Globo. Se soubessem, meu chefe, o Humberto Pereira, grande cara, certamente me absolveria desse pecado, ele que foi padre.
Deu para voltar a tempo de retomar o trabalho na segunda-feira, e a reportagem ficou muito boa.
Por um grave erro meu, sempre dei mais valor ao trabalho do que à família, e hoje me arrependo disso, mas essas coisas não têm volta.
Minha caçula, a Carolina, outro dia veio me cobrar essa ausência, mas nem por isso ela deixou de oferecer o almoço para a família em sua casa neste Dia dos Pais.
Mariana e Carolina também trabalham muito e espero que elas não sejam cobradas por isso mais tarde.
Mulheres, em geral, sabem dividir melhor o tempo entre o trabalho, a casa e a família.
Besteira pensar que o pai não faz falta, se a mãe é uma super mulher que cuida de tudo, não deixa faltar nada para os filhos, principalmente carinho e atenção.
Certa vez, faz muito tempo, Mariana era pequenininha, estava começando a andar e a falar, quando fui escalado pelo Estadão para cobrir a Copa do Mundo da Alemanha, em 1974.
Passei dois meses fora de casa, incluindo a fase de treinamentos da seleção de Zagalo, que ficou concentrada em Freiburg, na Floresta Negra.
Na minha longa ausência, fiquei sabendo que Mariana tinha parado de falar e andar.
Pois não é que no dia em que eu voltei, a menina veio correndo me abraçar no aeroporto e desandou a falar de novo, sem parar?
E não parou até hoje…
Feliz dia para todos os pais. O meu morreu moço, em 1960. Tudo faz muito tempo…
Eta vida boa que segue, do jeito que dá e Deus quer.
Texto publicado no blog do jornalista Ricardo Kotscho.