O ator e escritor Vinicius Campos fala sobre a falta de investimentos para criar e educar as crianças no Brasil. O dia das crianças deveria ser de luta
Vinicius Campos* Publicado em 08/10/2021, às 10h13
Terça-feira, doze de outubro, se comemora o Dia das Crianças.
Possivelmente os canais de televisão estão cheios de publicidades com brinquedos de última geração, talvez as companhias de celular mais agressivas e sem noção, estão tentando te convencer que seu filho precisa de um aparelho de smartphone, por mais que os especialistas dizem que nossos pequenos devem ficar longe das telas, e inclusive algumas editoras estão tentando chamar sua atenção falando sobre a importância da literatura na infância.
O fato é que, deixando de lado o negócio que as crianças podem gerar, os números mostram que, como sociedade, pouco nos preocupamos pelo seu real bem-estar.
A Noruega, por exemplo, investe, por ano, quase trinta mil dólares por criança, e neste cálculo que apareceu numa pesquisa da universidade de Minnesota, Estados Unidos, estão contemplados a educação e todas as ajudas que as famílias recebem para educar seus pequenos e acompanhá-los em seu desenvolvimento.
Já no Brasil, em 2019, o investimento em creches e escolas foi o menor em dez anos. E nem precisamos dizer que além da escola, as famílias não recebem nenhum benefício que as ajudem a cuidar de seus pequenos. É só escola mesmo, quando há vaga, e a qualidade da educação a gente fala em outro texto porque o buraco é mais embaixo.
O número de violência contra as crianças de nosso país também é péssimo. Já falei aqui antes. Por hora, onze denúncias de violência contra criança, sem contar toda a violência que não é denunciada. Não sei se estão acompanhando o caso do assassino Jairinho e sua cúmplice, Monique. Horrível, triste, e situações como esta são mais comuns do que imaginamos.
A lista de desrespeito e violação de direito da criança é enorme e eu não teria espaço aqui para falar de tudo o que precisamos melhorar para proteger nossos pequenos, porém dia doze de outubro alguns receberão presentes, famosos farão lindos posts sobre como amam seus filhos, e colocarão fotos de quando eram pequenos, e isso será tudo.
Ou seja, enquanto o dia da mulher, o dia da raça negra, o dia do trabalhador, são dias de luta para melhorar a vida destes grupos, o dia das crianças é uma bobagem comercial. Um dia de ir ao parque, de que pais ausentes se sentem no tapete da sala para brincar um pouco com os pequenos e retratem o momento para mostrar como são carinhosos.
Criança não se mobiliza, não pode organizar passeatas, protestos, mas nós pais podemos e deveríamos. Estaríamos dispostos a ir para as ruas brigar pelos direitos das crianças? Ou apenas entramos nos "salve-se quem puder" e tentamos proteger os pequenos da nossa família?
Trabalho para as infâncias há catorze anos. Me fascina a ideia de acompanhar um ser desde seus princípios e lhe ajudar a desenvolver as ferramentas necessárias para que ele seja a melhor versão dele mesmo no futuro. Entendo que se fomentamos infâncias livres, seguras e felizes, temos mais chances de formar adultos livres, seguros e felizes. E uma sociedade repleta de adultos felizes deve ser maravilhosa, não deve?
Neste dia das crianças eu não vou tentar vender meus livros, pelo contrário, neste último ano trabalhei voluntariamente para dar asas a um projeto. Um audiolivro gratuito, uma versão do clássico Branca de Neve, que produzi com a ajuda de doadores, da Skeelo Audiobooks, e de amigos talentosos que emprestaram seu talento para a realização deste sonho.
Alinne Moraes, Daphne Bozaski, Tiago Abravanel, Robson Nunes, Ivan Parente, Bruna Thedy, Natallia Rodrigues, Micheli Machado, e tantos outros que embarcaram comigo no sonho de levar às crianças um presente com uma mensagem que respeita suas infâncias e as convida a ver o mundo com um olhar fresco, empático e cheio de respeito pelo outro.
Coloque o fone de ouvido e curta o nosso presente para todas as crianças. E convido você pai, mãe, tio, avô, professor, a escutar nossa versão e descobrir um novo jeito de contar essa história. Pois se queremos que nossas crianças cresçam numa sociedade mais plural e feliz, precisamos urgentemente mudar o relato. Já é hora de pensar menos em negócio e mais em futuro.
A literatura é um grão de areia em tudo o que precisa ser feito, mas estou convencido que grandes transformações acontecem a partir de pequenas ações. Escute, compartilhe, façamos o áudio chegar o mais longe possível.
E feliz dia, criança!