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Ela viveu violência doméstica no interior do Ceará e hoje capacita mulheres nas periferias de SP

Fernanda Torres é mãe, empreendedora e sobrevivente de um relacionamento abusivo. Com o 'Escola Beautyfull', já ajudou 200 mulheres em situação vulnerável

Ana Beatriz Gonçalves* Publicado em 30/09/2021, às 16h10

Há 15 anos atuando na área de consultoria jurídica de salões de beleza, Fernanda encontrou oportunidade de capacitar mulheres
Há 15 anos atuando na área de consultoria jurídica de salões de beleza, Fernanda encontrou oportunidade de capacitar mulheres

Prestes a trazer ao mundo Thomas, seu segundo filho, Fernanda Torres, de 38 anos, diz que não parou na gestação. Mãe do Theo, de seis anos, a cearense revela que mesmo com uma gravidez difícil – marcada por diabetes gestacional e descolamento da placenta – encontrou um projeto que unia os seus negócios e também seu propósito de vida: capacitar mulheres em situação de vulnerabilidade.

"Eu estava com 3 meses de gestação quando esse projeto em Paraisópolis (comunidade localizada na periferia da zona sul da cidade de São Paulo) chegou pra mim. Pensei: 'Não posso dizer não'. Encarei como uma missão", afirma ela sobre a Escola BeautyFull, que ajuda mulheres periféricas e vítimas de violência doméstica a se capacitarem em um curso rápido e enxuto sobre procedimentos de beleza. 

Segundo Fernanda, até o momento a ação já ajudou cerca de 200 mulheres de Paraisópolis, que em um mês aprenderam práticas de cuidados como escovação, lavagem de cabelo, entre outros. A intenção, conta a empresária, que também é advogada e especialista em consultoria jurídica para salões de beleza, é que essas mulheres tenham a oportunidade de ganhar dinheiro – ou pelo menos um respiro no bolso.

"As mulheres foram as mais prejudicadas na pandemia. Eu via o quanto as mães sentiram dificuldade de trabalhar, cuidar do filho que ficou em casa. Graças a Deus eu tenho uma rede de apoio, mas quantas que não puderam trabalhar porque não têm ajuda?", indaga.

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Com duração de um mês e duas aulas por semana, Fernanda Torres diz que a Escola BeautyFull traz um formato enxuto para atender mães da comunidade e, possibilita também, que elas possam trabalhar mesmo com o filho do lado.

A ação em Paraisópolis fez tanto sucesso que a empreendedora já negocia a expansão. "O BeautyFull lançou um braço de escolas em comunidades, e também está na agenda dos bancos de ações com impacto positivo. O próximo passo é trabalhar no Jabaquara: lá atende em média 63 comunidades". E todos os cursos são gratuitos.

projeto visa capacitar mulheres em situação de violência doméstica
O sonho de Fernanda é expandir o projeto cada vez mais. (Foto: Divulgação)

violência doméstica
"A beleza de transformar vidas", é o slogan da ação. Fernanda Torres no dia da entrega dos certificados das alunas. (Foto: Divulgação)

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Sobrevivente de um relacionamento tóxico

Fernanda Torres aprendeu desde cedo sobre a importância da autonomia financeira. Nascida e criada no interior do Ceará, a 400 km de Fortaleza, ela começou a se relacionar muito jovem, aos 14 anos. A relação era bastante conturbada e marcada por abusos psicológicos.

Ela nunca se esquece da vez em que foi proibida de entrar em sua própria casa depois que fez mexas no cabelo. "Ele dizia que loira era 'puta'. Esse meu ex-marido não deixava eu trabalhar, sair de casa, era pura violência psicológica. Fiquei um bom tempo com ele por conta do financeiro, não me separava por isso", diz.

Após se formar em direito e passar na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), não demorou para que Fernanda terminasse a relação. "Passou um mês e eu vim pra São Paulo. Não conhecia ninguém, vim de mala e cuia", cita.

Ele não aceitou bem o término, chegou até a me perseguir e perseguir minha família. No começo foi difícil, cheguei sem conhecer nada. Pedi pro taxista me deixar na Avenida Paulista, que era o único lugar que eu conhecia, e depois fui deixando meu currículo de porta em porta", lembra Fernanda Torres.
Fernanda Torres foi vítima de violência doméstica
Fernanda Torres (Foto: Arquivo Pessoal)

Sem querer, Fernanda acabou conhecendo o atual marido depois de um ano morando em São Paulo. Já a maternidade aconteceu exatamente após 10 anos da mudança de estado, quando ela tinha 34 anos. "Eu sempre quis ser mãe, só sentia essa dificuldade de não ter a minha família por perto. O Theo me pedia muito um irmãozinho, pedia até em oração [risos]. Acabei postergando por conta do trabalho, fui adiando o máximo que pude", fala sobre a segunda gravidez.

Como sempre sonhou em ter dois filhos, veio o Thomas, que inclusive, nasce amanhã, dia 1º de outubro. Apesar das broncas do seu médico, que pediu repouso durante a gestação, ela afirma que não se arrepende de ter investido seu tempo e energia no projeto de capacitação de outras mulheres. "Vamos dar autonomia financeira para elas", garante.

violência doméstica - personagem
Fernanda Torres com sua família. (Foto: Arquivo Pessoal)

*Ana Beatriz Gonçalves é jornalista e repórter do Papo de Mãe

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