Papo de Mãe

Lagarta Vira Pupa e blog vira livro

Roberta Manreza Publicado em 16/07/2016, às 00h00 - Atualizado em 19/07/2016, às 08h02

Imagem Lagarta Vira Pupa e blog vira livro
16 de julho de 2016


Por Andréa Werner*, jornalista e redatora do blog Lagarta Vira Pupa

Andrea(1)

Há exatamente 6 anos, quando o médico me disse “seu filho tem transtorno global do desenvolvimento”, eu senti várias coisas juntas. A visão turvou, o estômago reagiu como se tivesse levado um soco, e foi como se a cadeira tivesse sumido debaixo de mim… e, com ela, o chão. Eu não sabia o que era “transtorno global do desenvolvimento” (como o autismo era chamado naquela época), mas sabia que não era bom. Do lado de fora da porta, meu bebê brincava com sua babá, totalmente alheio à tempestade que ocorria entre aquelas quatro paredes. Theo tinha dois aninhos e era lindo e rechonchudo.

Quando consegui recuperar um pouco do fôlego, a primeira pergunta que me ocorreu foi “mas é um atraso? Então, quer dizer que ele pode alcançar o que foi perdido? Isso tem cura?”. E o médico balançou a cabeça. Eu esmagava a mão do meu marido, que esmagava a minha em contrapartida. Foi o pior momento da minha vida.

Ao chegarmos em casa, nos abraçamos, choramos muito, e falamos “estamos sozinhos nessa”. Um tentava se apoiar no outro, mas como? Quem tinha pernas firmes neste momento? Quem poderia consolar o outro se ambos estavam devastados, em luto? O que fazer com aquele caminhão de sonhos, de expectativas? “Por que eu? Por que o meu menino?”, eram as questões que repetíamos entre nós.

Na falta de pessoas reais com quem conversar a respeito, fui para a internet. Em 2010, as redes sociais ainda não tinham a força que têm hoje. Era a época dos grupos de e-mail. Encontrei um só com pais de crianças que tinham Síndrome de Asperger, uma forma mais branda de autismo. Já era alguma coisa…

Informações desencontradas em sites, esperança demais ou de menos. Ou meu filho iria comer as próprias fezes e se automutilar ou iria ser um gênio da física digno de Prêmio Nobel. Onde encontrar um meio termo? Como entender as reais possibilidades? E, acima de tudo, por onde começar? Como intervir?

Acabei conhecendo outras mães que foram me guiando até melhor que os médicos. Ajustei as terapias do Theo, entendi melhor o autismo, entendi que ele afetava muito mais que o cérebro: meu filho tinha baixo tônus muscular no rosto, nas pernas, desordem sensorial, e muitas coisas que eu precisava entender melhor para poder ajudá-lo. Santas mães! Afinal, é verdade que só quem passa pelo que passamos nos vai entender.

E foi neste momento, quase 2 anos após o diagnóstico, já refeita do luto inicial e cheia de esperanças que decidi começar um blog. O nome “Lagarta Vira Pupa” veio de uma música do Cocoricó que meu filho costumava cantar e tem tantos significados! No início, eu achava que Theo era minha lagartinha que tinha entrado na pupa, se fechando para o mundo. Depois, fui perceber que a lagarta era eu, e que Theo me guiou e proporcionou a grande metamorfose da minha vida. Sou, sem dúvidas, uma pessoa melhor após essa experiência!

O blog veio para que outras mães na mesma situação encontrassem acolhimento, informação mais mastigada, esperança, tudo naquele momento em que o estômago ainda dói e o chão ainda falta. Aquela hora em que você quer se apoiar no parceiro, mas as pernas dele estão tão bambas quanto a sua. Eu queria gritar “EXISTE VIDA APÓS UM DIAGNÓSTICO DE AUTISMO!”. Queria que elas soubessem que, sim, ia ser difícil, mas era possível refazer os sonhos, viver, sorrir, mesmo após um golpe tão forte. Queria que soubessem que aquele momento inicial vai passando e as coisas melhoram porque passamos a conhecer melhor nossos filhos. E porque ficamos mais fortes.

E que a metamorfose que sofremos depende de uma luta pessoal para que a amargura não nos domine. Depende de entendermos que a vida não está nem aí para as nossas regras, cronogramas e planos. E que precisamos aprender a dançar conforme a música, abraçando a chance de sermos felizes com a vida que temos, e não a que desejávamos ter.

Quatro anos de blog me mostraram que a quantidade de mães precisando de apoio é muito maior do que eu imaginava. E não são só mães: são famílias que querem entender melhor a situação no neto, do primo, do sobrinho. São educadores que querem ensinar da forma que essas crianças aprendem. Profissionais da saúde que querem acolher melhor esses pacientes e seus pais.

E foi aí que o segundo projeto brotou: o blog virou um livro. Os melhores textos compilados com alguns inéditos, muitas ilustrações coloridas e delicadas para trazer leveza a um assunto que, muitas vezes, pesa. Leveza a um conteúdo denso, pois falo de emoções, de sentimentos, daqueles que guardamos escondidos lá no fundo da gaveta.

Nasceu meu projeto mais importante depois do Theo! O livro “Lagarta Vira Pupa: a vida e os aprendizados ao lado de um lindo garotinho autista”. Espero que ele possa alcançar ainda mais pessoas que o blog. E que mais mães encontrem acolhimento, apoio e esperança, tudo aquilo que eu não tive quando recebi o diagnóstico do Theo. E que meu filho saiba, no futuro, o bem enorme que ele fez para tanta gente mesmo sem saber, mesmo sem planejar.

Theo tem nos surpreendido a cada dia. Está sendo alfabetizado aos poucos, no ritmo dele. Quem sabe, um dia, ele não lance seu próprio livro?

Eventos de lançamento do livro:

*Andréa Werner é mãe, jornalista, redatora do blog Lagarta Vira Pupa e autora do livro “Lagarta Vira Pupa: a vida e os aprendizados ao lado de um lindo garotinho autista”.




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