O Brasil foi um dos países que mais manteve as escolas fechadas na pandemia. Agora, é hora de todos se unirem para apoiar as crianças e os adolescentes
Ana Ligia Scachetti * Publicado em 27/04/2022, às 06h00
Trabalhar com alunos em diferentes níveis de aprendizagem sempre foi um ponto de atenção para os educadores. Mas com a pandemia de covid-19, que nos levou ao distanciamento social por quase dois anos, esse aspecto se intensificou bastante nas salas de aula brasileiras.
A Unicef estima que mais de 5 milhões de estudantes não tiveram acesso à educação em 2020 no nosso país. Naquele primeiro ano de pandemia, uma pesquisa realizada pela equipe da Nova Escola, mostrou que 59% dos professores de escolas privadas diziam que a maioria dos seus alunos estavam participando das atividades remotas, enquanto nas escolas públicas este número era de apenas 32%.
Todos sabemos que, de lá para cá, os professores, as famílias e os próprios estudantes se desdobraram para tornar alguma aprendizagem possível. Mas também sabemos que, apesar dos esforços, as perdas causadas pelos dois anos de pandemia são enormes e ainda maiores no caso das escolas públicas. Para agravar a nossa situação, nós fomos um dos países que tiveram o maior tempo de suspensão de aulas: a média em que as escolas brasileiras permaneceram completamente fechadas , em 2020, foi de 178 dias letivos. Já nos países membros da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) esse número é de 58 dias.
Uma outra pesquisa da Nova Escola realizada em 2021 sobre a percepção dos educadores em relação à volta às aulas presenciais mostrou que 62,8% dos respondentes indicaram que o maior desafio enfrentado na retomada das aulas presenciais era a diferença entre os níveis de conhecimento dos alunos. A defasagem é uma consequência desses quase dois anos e um dos grandes desafios dos professores de 2022 em diante, com a volta das aulas presenciais.
A pandemia, entretanto, aproximou a escola de um parceiro essencial: as famílias das crianças e dos adolescentes. Durante o período de ensino remoto, muitos professores contaram com pais ou responsáveis para conseguir que as atividades propostas chegassem e fossem compreendidas pelos estudantes. O contexto mudou, felizmente, mas esse diálogo estreito não deveria terminar.
Agora é hora de retomar, mas, para isso, temos que conseguir que as crianças e os jovens voltem para a escola e aí começa um papel essencial dos adultos que os acompanham. É preciso valorizar, em casa, o retorno ao ambiente escolar.
Os responsáveis também podem ajudar os professores a saber quem é este aluno que volta para a escola. Que experiências ele teve? O que aprendeu neste período? Por quais perdas ou dificuldades ele passou? Com quem e de que ele brincou enquanto estava em casa? Tudo isso precisa ser diagnosticado e acolhido.
Finalmente, com as questões emocionais, comportamentais e contextuais consideradas, olhemos para a parte mais formal do aprendizado. Temos que ganhar tempo e favorecer que os alunos de hoje consigam seguir sua vida escolar com qualidade nos próximos anos. Para isso, a escola vai precisar priorizar o escopo a ser trabalhado, variar as estratégias de ensino, avaliar constantemente e planejar com base no que a avaliação revelar. A lição de casa, projetos e pesquisas feitos fora do horário de aula podem ser aliados relevantes neste processo e os pais e responsáveis podem ser envolvidos para acompanhar e potencializar tais percursos de aprendizagem.
Recompor indica que queremos reconstruir de outra maneira. Não vamos voltar ao que era em 2019. Precisamos apoiar os estudantes nos novos desafios que surgiram com a pandemia, atuando de maneira articulada entre Secretaria de Educação, gestores escolares, professores e familiares. Com o comprometimento de toda a comunidade escolar podemos garantir um futuro digno e justo para todos os brasileiros e as brasileiras que estão hoje matriculados em nossas escolas.
Ana Ligia Scachetti é pedagoga e jornalista, atualmente atua como diretora de Educação da Nova Escola, organização de impacto social voltada a apoiar e oferecer recursos para professores e fortalecer a Educação pública no Brasil.É especialista em Metodologias Ativas para uma Educação Inovadora pelo Instituto Singularidades e em Jornalismo Social pela PUC de São Paulo e foi finalista do Prêmio Esso de Jornalismo – Categoria Educação com a reportagem “A escola e a vida nos rios do Amazonas”. Já atuou também como professora de alfabetização na EJA.
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