As diferenças entre os sistemas alimentares convencionais e os agroecológicos. Um artigo de Ariela Doctors, com receita de salada no final
Ariela Doctors* Publicado em 17/03/2021, às 00h00 - Atualizado às 10h38
Dia 15 de março, na segunda-feira, foi o Dia Mundial do Consumidor.
Será que temos motivos para comemorar?
Estamos passando por uma das piores crises sanitárias que o Brasil já atravessou e o preço dos alimentos disparou.
Pelo menos 10 milhões de pessoas voltaram a sentir fome no país.
Nosso modelo de produção agrícola, infelizmente, nos faz comer menos e pior.
Mesmo os que têm acesso a mercados e ao alimento, muitas vezes nem percebem o quanto somos reféns da indústria alimentícia e dos nossos modelos de produção. Isso interfere não só em nossa saúde e na das nossas crianças, como também no meio ambiente.
A população mundial dobrou desde a metade do século passado. Com isso, a produção de alimentos teve de aumentar também. Já não é novidade para ninguém que nosso planeta tem sido super explorado.
“Estamos cortando árvores mais rápido do que elas podem rebrotar, convertendo pastagens nativas em desertos por excesso de carga animal, sobre explorando os aquíferos e secando os rios. Nas áreas cultivadas a erosão empobrece a fertilidade natural dos solos. Estamos pescando mais rápido do que a capacidade de reprodução das espécies. Emitimos CO2 para atmosfera em ritmos mais acelerados do que a capacidade de a natureza absorvê-lo, acentuando o efeito estufa e as mudanças climáticas globais. A degradação dos habitats e as mudanças climáticas promovem a extinção de espécies vivas mais rápido do que suas capacidades de se adaptarem, o que significa que estamos provocando a primeira extinção em massa no planeta desde a que erradicou os dinossauros há 65 milhões de anos.” (WEID, 2009, p.47).
O modelo de agricultura convencional tradicional utilizado atualmente, com extensas áreas de plantio de uma mesma espécie, as monoculturas, requer grandes quantidades de insumos externos, como fertilizantes inorgânicos e agrotóxicos para sua manutenção. Além de empobrecer o solo, sujar as águas e envenenar os agricultores, esse modelo e seus componentes chegam aos nossos corpos por meio de alimentos pobres em nutrientes e ricos em insumos fertilizantes que nos adoecem aos poucos. Muitas pesquisas e estudos científicos apontam a relação dos agrotóxicos e o desenvolvimento de vários tipos de câncer. Na área de aditivos sintéticos, Polônio e Peres (2009) ressaltam a carência de pesquisas sobre o tema, mas compilam alguns estudos de diferentes tipos de aditivos que podem trazer riscos à saúde, em particular à saúde infantil. Na revisão desses autores, o número de estudos foi maior e os resultados mais consistentes quanto às manifestações clínicas de rinite, urticária, angioedema, asma e alergias provocadas pelos aditivos, em particular pelos corantes artificiais (Promoção da Saúde, Sustentabilidade e Agroecologia: uma discussão intersetorial, de Elaine de Azevedo; Maria Cecília Focesi Pelicioni).
Então, como fazer para alimentar uma população que só cresce, num espaço que não tem como ser ampliado, com recursos naturais finitos, de forma saudável? Sustentabilidade. Pois é, essa palavra já foi tão aplicada seja em textos acadêmicos ou notícias de jornal. Utilizada em artigos científicos, em propagandas de TV e em embalagens de alimentos. Mas, será que o conceito de sustentabilidade foi realmente aplicado?
Uma das possibilidades de cooperar para uma real transformação planetária é através das nossas escolhas alimentares. Comemos (quem pode) ao menos, três vezes ao dia. Nós, como mães e pais, alimentamos nossos filhos e filhas e construímos hábitos alimentares todos os dias que, normalmente, ficam por toda a vida.
Existe uma outra forma de produção de alimentos, que além de gerar menos impactos ambientais, pode melhorar nossa saudabilidade, com alimentos mais nutritivos e sem agrotóxicos. A agroecologia.
A Agroecologia pode ser uma estratégia intersetorial de promoção da saúde, de sustentabilidade e de segurança alimentar e nutricional. Podemos dizer que a agroecologia é um movimento sociopolítico que busca fortalecer o agricultor em busca de sua identidade e raízes culturais e, também sua autonomia, seu poder de decisão e participação ativa no processo produtivo. A Agroecologia, mais do que tratar do manejo ecologicamente responsável dos recursos, constitui-se em um campo do conhecimento científico que pretende estudar a atividade agrária, partindo de um enfoque holístico e de uma abordagem sistêmica (Caporal e col., 2009). Muitos opositores à agroecologia e aos sistemas alimentares sustentáveis alegam que seria impossível produzir alimentos suficientes para a humanidade por meio de tais sistemas. Porém, muitos autores, comparando sistemas orgânicos e convencionais, discordaram de tal afirmação e concluíram que a produção orgânica, em base por hectare, pode se igualar à convencional na grande maioria dos cultivos avaliados.
O tema é extenso e cheio de controvérsias. Mas, o fato é que boas escolhas geram bons impactos. A Terra é definitivamente redonda e está tudo interligado.
Então, se você puder optar na hora da compra, por alimentos provenientes de sistemas agroecológicos, que foram plantados ou processados em áreas próximas de onde você mora e alimentos da biodiversidade local, com certeza você estará escolhendo alimentar sua família de forma mais saudável, ficará menos dependente de vitaminas e remédios e ainda estará fomentando a agricultura familiar e impactando de forma positiva o seu entorno e o meio em que vivemos.
Aqui vai uma deliciosa receita de salada com produtos locais e com PANC (plantas alimentícias não convencionais) que podem ser substituídos por diversas folhas da sua preferência e da biodiversidade local! E não esqueça de convidar as crianças para fazerem a salada junto com você!
● 2 batatas-doces
● 1 xícara de folhas de panc – Ora pró nobis ou Peixinho da horta
● 1/2 xícara de flores de panc – Capuchinha ou outra que encontrar
● 1/4 de xícara de cebolinha fresca picada
● 1/2 maço de rúcula
● 1/4 de xícara de folhas de mostarda
● 1/4 de xícara de suco de limão siciliano (1⁄2 limão)
● 3 colheres de sopa de shoyu (molho de soja)
● 1 colher de chá de pimenta rosa em grãos
● 1/2 dente de alho
● Noz moscada à gosto
● 3 colheres de sopa de óleo de gergelim (opcional)
● 1 colher de sopa de azeite de oliva extra virgem
Você pode acessar outras receitas no site Comida e Cultura.
@projetocomidaecultura
*Ariela Doctors é chef, comunicadora e mãe
Assista ao programa do Papo de Mãe sobre alimentação: