Eloisy precisou de “pulmão artificial” para sobreviver com Covid-19. Foi a primeira vez que tratamento, não oferecido na rede púbica, foi utilizado no SUS de MG
Sabrina Legramandi* Publicado em 24/09/2021, às 07h55
Um verdadeiro susto atingiu a família de Eloisy Cristina dos Santos, de 14 anos, de Minas Gerais. De uma hora para outra, a adolescente, que não está tendo aulas presenciais e não está saindo de casa, contraiu o novo coronavírus.
O pai de Eloisy, dias antes, havia sido internado com um quadro de pneumonia e, por isso, a família decidiu levar a adolescente ao médico quando apresentou alguns sintomas. Eloisy, mesmo sendo jovem e sem comorbidades, foi internada com um quadro grave da Covid-19.
“Parecia que um raio estava caindo duas vezes no mesmo lugar”, conta Josiany Francisca da Silva, a irmã da menina. Porém, ao contrário do pai (padrasto de Josiany), Eloisy não reagia a nenhum tratamento.
Eu dormi com a minha irmã viva achando que ela tinha simplesmente uma gripe e acordei com a notícia de que ela estava morrendo." (Josiany Francisca da Silva)
Foi uma fisioterapeuta da Santa Casa BH, hospital pertencente à rede do SUS (Sistema Único de Saúde) em Minas Gerais, que identificou o quadro clínico da adolescente e viu a necessidade da cartada final para tratar a menina: a ECMO (Oxigenação por Membrana Extracorpórea, na tradução do inglês) ou “pulmão artificial”. O tratamento, porém, não está disponível no SUS.
A profissional resolveu contatar uma equipe especializada na terapia, a ECMO Minas, o que fez com que os médicos, de madrugada, começassem a se mobilizar para salvar a vida de Eloisy. “A ECMO Minas, uma empresa privada, ofereceu gratuitamente o serviço, o cirurgião e os enfermeiros”, conta a médica Marina Fantini, diretora da empresa. Foi a primeira vez que o pulmão artificial foi utilizado em uma rede do SUS do estado de Minas Gerais.
Com o tratamento, os médicos conseguiram enfrentar o novo coronavírus, que estava causando as complicações pulmonares, e neste mês a menina recebeu alta, após um mês de internação. Josiany conta que, com a irmã em casa, o ambiente é outro.
Acredito muito em Deus, mas nós tivemos anjos aqui na terra. Pela nossa condição financeira, nós não poderíamos ter feito esse procedimento com o pulmão artificial.” (Josiany Francisca da Silva)
No dia 25 de junho deste ano, o Ministério da Saúde, por recomendação da Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do Sistema Único de Saúde), decidiu não incorporar o tratamento ao SUS.
Para Marina Fantini, o caso individual de Eloisy não abre portas para que a rede de solidariedade e o procedimento seja feito nas redes do SUS para todos os pacientes que precisam. Ele mostra apenas a importância da democratização do procedimento.
Uma coisa que a gente precisa fazer é mostrar que a ECMO salva vidas e que é preciso fazer isso em um hospital do SUS.” (Marina Fantini)
A médica comenta que, a longo prazo, o custo do tratamento não é grande, pois evita sequelas e maiores problemas que podem exigir procedimentos ainda mais caros. “É possível organizar uma rede ECMO no SUS, o que falta é o querer de quem está na gestão”, afirma.
Marina conta que poder salvar a vida da Eloisy também a fortaleceu e lhe deu ânimo para continuar em busca de levar o pulmão artificial a mais pessoas. “Em Belo Horizonte vivemos um déficit imenso de terapias de alta complexidade, mas esse caso mostra que é possível levar a ECMO ao SUS”, finaliza.
Josiany não esconde a gratidão dela, de sua mãe e de seu padrasto pela oportunidade de ter conseguido incluir a ECMO no tratamento de Eloisy. Ao falar com Marina, durante a entrevista ao Papo de Mãe, a irmã da paciente comenta sobre a rede de solidariedade criada no hospital.
A família sofre, mas entendo que os médicos também sofrem. É uma luta dos dois lados. Eu poderia ter todo o dinheiro do mundo e eu não conseguiria pagar tudo o que vocês fizeram por nós.” (Josiany Francisca da Silva)
*Sabrina Legramandi é repórter do Papo de Mãe