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Praça pública ou shopping center: qual é o ambiente digital que desejamos para nossas crianças e adolescentes?

O peso da internet no desenvolvimento das novas gerações e o impacto do ambiente digital na infância e adolescência

Giovana Ventura, Maria Mello e Thaís Rugolo* Publicado em 29/04/2022, às 11h19

O ambiente virtual pode ser um risco para a criança - Foto: banco de imagens
O ambiente virtual pode ser um risco para a criança - Foto: banco de imagens

Quando pensamos em proteção de crianças e adolescentes na Internet, a relação mais imediata que fazemos parte de um ponto de vista mais explícito, como possibilidades de assédio, bullying e pornografia nas redes sociais. Claro, essas são preocupações pra lá de pertinentes, já que hoje mais de ⅓ de todos os usuários de Internet do mundo são crianças, e que, para serem enfrentadas, precisam da adoção de um verdadeiro pacote de ações de toda a sociedade. Mas, além desses riscos mais visíveis, o espaço digital também abriga conteúdos e dinâmicas perigosas que podem passar despercebidas e que, inclusive, também têm a ver com a segurança dos pequenos: a exploração comercial infantil.

Embora seja mais evidente em outros espaços, como na TV aberta e nas escolas, essa prática domina canais de vídeos, jogos e apps de interação. E esse não é um tema novo. Se você tem mais de 30, vai se lembrar perfeitamente de algum comercial com uma “música chiclete”, ou uma frase impossível de esquecer e que, inclusive, te colocava em situações não tão engraçadas, quando, por exemplo, o amiguinho bradava que ele tinha qualquer produto incessantemente exibido nos intervalos das programações televisivas e nas estações de rádio, e você não.

Apesar de hoje conseguirmos repelir a forma com que esse tipo de conteúdo persuasivo nos atinge e, por isso, acreditar que essas novas formas de fazer publicidade se tornaram menos apelativas, elas, na verdade, devem ser motivo ainda maior de preocupação. Especialmente quando se dirigem a pessoas que ainda estão em desenvolvimento e que, pela lei e pela ciência, são considerados indivíduos hipervulneráveis, o que acaba exigindo um tratamento e proteção prioritária de toda a sociedade.

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Isso porque, no Brasil, a publicidade infantil é proibida. Isso significa que as empresas não podem mais direcionar sua comunicação ao público infantil (pessoas de 0 a 12 anos). No entanto, apesar da vedação legal, muitas ainda insistem em comunicar seus produtos e serviços a esse público. Em realidade, as redes sociais e plataformas digitais como o YouTube possibilitaram novas dinâmicas de exploração comercial: contratação de influenciadores digitais, adultos ou crianças, realização de abertura de produtos (unboxing), inserção de marcas em jogos, vídeos e sites destinados ao público infantil dentre outras ações. 

Assim, se por um lado devemos celebrar o desenvolvimento das Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) – percebemos nos últimos dois anos, mais do que nunca, o seu potencial emancipador e educativo, inclusive para as crianças – por outro, o fato é que a Internet não foi pensada para o público mais jovem. Assim, nos acostumamos com produtos e serviços digitais que, em princípio, são proibidos para crianças de acordo com suas próprias normas. Todavia, atualmente no Brasil, 49% das crianças já possuem o próprio smartphone. Com isso, passam, inegavelmente, a acessar conteúdos que nem sempre são seguros para elas. Há pesquisas, por exemplo, que comprovam que plataformas, jogos e redes sociais como  YouTube, TikTok, Instagram, Facebook e PK XD, entre outros, que vedam a utilização dos serviços por usuários menores de 13 anos, possuem grande quantidade de usuários nessa faixa etária.

Assim, muito embora oficialmente não devam estar nesses espaços, as crianças acabam acessando-os, devido a falhas das próprias empresas em criar obstáculos mais efetivos. Inclusive, considerando que o seu acesso é um direito, é urgente protegermos as crianças na Internet e não da Internet. Por isso, é essencial garantir que o ambiente digital seja seguro para todos, inclusive para os mais vulneráveis.

Em recente documento produzido, o Comitê dos Direitos das Crianças da ONU atualizou a Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989, frente às exigências de uma era digital, entendendo que é dever das empresas respeitar os direitos das crianças, além de prevenir e remediar abusos no ambiente digital. Especificamente sobre exploração comercial, a ONU veda às empresas o direcionamento de conteúdos comerciais com base nos dados pessoais coletados das crianças e adolescentes, prática que, apesar de invasiva, é amplamente utilizada pelas empresas de tecnologia. 

A técnica sofisticada de explorar comercialmente crianças e adolescentes por meio do direcionamento de anúncios personalizados com base em interesses previamente coletados, inclusive, foi destacada recentemente por Joe Biden. Na ocasião, o político enfatizou a urgência em proibir, no país, a publicidade dirigida às crianças nas redes sociais, ressaltando a necessidade de responsabilização dessas lucrativas plataformas.

Se o ambiente digital fosse um espaço físico, poderíamos dizer que hoje ele se parece com um verdadeiro shopping center, com ofertas publicitárias (ilegais e abusivas quando voltadas a crianças) por todos os lados. No entanto, se queremos proteger as infâncias e adolescências, é crucial buscarmos transformá-lo em uma verdadeira praça pública, em que as descobertas e experiências on-line sejam livres de interesses comerciais.

* Giovana Ventura é jornalista e contribui com as redes sociais do programa Criança e Consumo, do Instituto Alana.

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Giovana Ventura

* Maria Mello é coordenadora do programa Criança e Consumo, mãe, jornalista, com mestrado em Políticas de Comunicação pela Universidade de Brasília e experiência de mais de 15 anos de atuação em comunicação e advocacy de organizações da sociedade civil brasileira.

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Maria Mello

* Thaís Rugolo é assistente Jurídica do programa Criança e Consumo, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

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Thaís Rugolo

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