10 situações que irão sensibilizar e escancarar que uma criança jamais poderia ser tratada como um adulto pequeno
Edmo Atique Gabriel* Publicado em 29/12/2021, às 07h00
Talvez possa parecer estranho, mas muitas vezes, mesmo sem perceber e sem qualquer intenção, tratamos uma criança como um adulto pequeno. Em todos os sentidos - fisicamente tal como emocionalmente.
Isto causa um sério conflito e pode prejudicar a vida desta criança, seu desenvolvimento e seu processo natural de socialização.
Não precisamos sofisticar muito para perceber que existem diferenças muito claras entre uma criança e um adulto. Dessa forma, já começamos a contestar esta falsa tese de que a criança seria um adulto pequeno. Podemos inclusive acrescentar que, talvez por uma questão de comodismo, uma suposta facilitação das coisas, as crianças poderiam ser vistas como adultos em miniatura.
Enfim, cabe uma profunda reflexão acerca da não compatibilidade entre estes dois conceitos - criança e adultos pequenos. Para fortalecer esta incompatibilidade, vou apresentar para vocês 10 situações, todas sob a forma de perguntas, as quais terão como resposta óbvia um sonoro “não”, mas que certamente irão sensibilizar e escancarar que uma criança jamais poderia ser tratada como um adulto pequeno.
Os adultos costumam ingerir bebidas alcoólicas; desta forma, as crianças também poderiam ter este hábito, consumindo doses proporcionalmente menores?
Os adultos praticam atividades físicas, várias modalidades de impacto e algumas aeróbicas - no caso das crianças, vamos então aplicar as mesmas regras e apenas reduzir a intensidade e a velocidade dos movimentos?
Os adultos adoram abusar de alguns tipos de alimentos, como gorduras e doces. As crianças também não poderiam ser privadas destes “prazeres “, seria muito injusto, afinal de contas elas somente são menores em tamanho. Não é verdade?
Os adultos vivem um mundo focado no trabalho, na competitividade e isto também tem de ser ensinado precocemente aos adultos pequenos, ou seja, as crianças. Como a criança é um adulto pequeno, por que incentivar a socialização desta criança com outra criança - na verdade, a criança poderia já interagir direto com os adultos, não é mesmo?
Quando um adulto usa um determinado medicamento para qualquer que seja a finalidade, existe logicamente uma dose apropriada e compatível com sua superfície corpórea. No caso das crianças, basta dar a metade da dose que já funciona. Com esta dose pela metade, nenhuma criança teria qualquer efeito colateral, correto?
Os adultos sobrevivem financeiramente graças ao seu trabalho diário. Sendo assim, as crianças deveriam ter algum tipo de trabalho e começar a colaborar com as despesas da casa, o que torna esta história de trabalho infantil uma verdadeira balela, não é mesmo ?
Os adultos praticam o sexo, como uma atividade fisiológica e como uma busca pelo prazer. As crianças não poderiam ser privadas disto, visto que, como adultos pequenos, bastaria que houve a prática sexual entre as próprias crianças - vocês concordam com isto?
Os adultos viajam sozinhos, dirigem seus veículos - as crianças poderiam também ter esta liberdade e, desde que o veículo seja proporcionalmente menor, não haveria nenhum problema - não é verdade?
Muitos adultos sabem manusear armas de fogo, podem inclusive receber treinamento específico para esta finalidade. Qual seria o problema de uma criança manusear uma arma de fogo também, desde que ela seja treinada para isto - você concorda?
Seria redundante afirmar que a informação, atualmente, é um fenômeno globalizado. Os adultos podem acessar todo tipo de conteúdo, sem restrições. Por que então restringir as crianças deste acesso completo? As crianças, sendo adultos pequenos, também deveriam acessar todo e qualquer tipo de conteúdo?
Imagino que a grande maioria das pessoas tenha a tendência de responder “não “a todas estas situações descritas. Certamente esta resposta negativa não seria necessariamente fundamentada num simples conservadorismo, mas num óbvio bom senso.
A natureza todos os dias nos mostra que existem ciclos a serem cumpridos. Da mesma forma que existe dia e noite, sol e lua, temos de encarar o ser humano como alguém que vive de acordo com ciclos. Esta lei universal por si só já mostra que uma criança deveria ser inserida e ser motivada para viver literalmente como criança, jamais como um adulto pequeno.
Esta forma absurdamente simplista de transformar uma criança em um adulto pequeno pode acabar com a vida desta criança. A incorporação precoce de certos hábitos e o enfrentamento desnecessário de certos conflitos podem gerar problemas físicos e emocionais numa criança que, um dia e no tempo certo, passará a ser verdadeiramente um adulto.
Quantas vezes pregamos que as crianças serão os cidadãos do futuro? Que o futuro de uma nação depende da formação das crianças? Tudo isto é pura verdade, mas, estranhamente, muitas vezes queremos antecipar as etapas e atribuímos às crianças, que não são e nunca serão adultos pequenos, funções, responsabilidades e comportamentos incompatíveis com esta fase inicial da vida!
Uma criança definitivamente não pode ser conceituada nem tratada como um adulto pequeno. Seu corpo , suas funções orgânicas e sua personalidade ainda necessitam de uma moldagem que somente o tempo e a família poderão consolidar.
*Dr. Edmo Atique Gabriel é cardiologista, cirurgião cardio vascular e nutrólogo. @edmoagabriel
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