A médica Tanit Ganz Sanchez faz um alerta importante sobre possíveis efeitos colaterais que próteses de silicone podem provocar, inclusive a longo prazo
Dra.Tanit Ganz Sanchez* Publicado em 03/08/2021, às 09h37
Qual mulher com seios menores nunca pensou em colocar silicone, antes ou depois de ser mãe? Eu pensei!
Amamentei duas filhas por 10 meses cada uma e não me arrependo de modo algum.
Quando parei de amamentar, a visão no espelho me fazia ter saudades do tamanho anterior dos seios quando estavam cheios de leite. Até pensei que um silicone cairia bem, mas arquivei o assunto.
Hoje, 18 anos depois, olho para trás e agradeço por ter procrastinado naquela época. Eu não sabia o que sei hoje. Sem querer, posso ter evitado o pesadelo que se segue ao sonho de colocar próteses de silicone.
Conhecer o profundo arrependimento de mulheres que sofreram com vários sintomas após a colocação do implante de silicone mexeu muito comigo. Eu me coloquei no lugar delas.
Como médica de visão integrativa, optei por divulgar alguns riscos menos comentados. Não sou contra a cirurgia; sou a favor da conscientização dos riscos para que a decisão de cada mulher seja mais embasada.
Então, mães, estejam atentas.
O sistema imunológico é a nossa frente de batalha para proteger o corpo contra invasores, tais como vírus, bactérias, fungos etc. Quem não se lembra de uma faringite ou amigdalite que se resolveu porque o invasor foi completamente anulado? Costuma ser assim.
Infelizmente, algumas mulheres têm seu sistema imunológico menos preciso; além do invasor, ele também ataca células do próprio corpo. Elas tendem a ter doenças autoimunes como a tireoidite de Hashimoto, doença celíaca, vitiligo, psoríase, artrite reumatoide, diabetes tipo 1, lúpus, esclerose múltipla e muitas outras.
Dra. Tanit, onde você quer chegar?
O implante de silicone é visto pelo corpo como um invasor. O sistema imunológico tenta expulsá-lo, mas não consegue porque ele é grande e chegou para ficar. Então, nossa frente de batalha produz uma capa protetora ao redor dele para isolá-lo do restante do corpo.
A questão é que essa capa deveria ser suficiente para tranquilizar nossos amigos batalhadores. Algo do tipo: já que o invasor não poderá ser expulso, pelo menos ele está quieto e isolado.
Só que não.
A prótese de silicone pode provocar efeitos colaterais cumulativos, seja porque ela contém neurotoxinas e metais pesados (que são tóxicos para as células e ainda se acumulam em órgãos vitais como cérebro, fígado, rins, ossos e coração) ou porque o sistema imunológico de algumas mulheres luta constantemente contra o silicone. Em lutas constantes, sobram tiros perdidos para células normais do corpo.
Por essas e outras, vários sintomas podem aparecer pouco ou muito tempo após a cicatrização da cirurgia. E o pior... eles vão além das mamas e aparecem em momentos tão diferentes que a mulher nem desconfia que eles podem estar relacionados entre si e com o silicone.
São eles: fadiga crônica, névoa cerebral (dificuldade de reunir pensamentos, se concentrar ou lembrar coisas recentes - “sensação que eu não sou mais eu”), queda de cabelo, boca seca, dores musculares ou articulares, formigamento, baixa libido, insônia ou sono não reparador e suor noturno (Brawer, 1998, 2017, 2018; Colaris e cols, 2017; Watad e cols, 2018; Borba e cols, 2020). Problemas de ouvido como zumbido, tontura, ouvido tampado ou perda de audição foram o caminho para esse assunto chegar até mim.
Esses sintomas de toxicidade do silicone ficaram conhecidos como Doença do Silicone ou ASIA (do inglês: Síndrome Autoimune/Inflamatória Induzida por Adjuvante). Adjuvante é tudo que colocamos dentro de nós que funciona como um corpo estranho e ativa o sistema imune.
Segundo as mulheres que ouvi, aí começa uma saga: a busca por ajuda com esses sintomas, inúmeros exames normais apesar do prejuízo na qualidade de vida, o desconhecimento de colegas médicos (eu também era assim), sem falar na piora dos relacionamentos porque essas mulheres são rotuladas como chatas de tanto que reclamam.
As próteses de silicone preenchem espaços vazios que nem sempre são de glândulas mamárias, mas sim de autoestima. Sonhar na frente do espelho com uma imagem diferente que nos traga amor e realização pode parecer uma ajuda para a saúde mental, mas pode virar um pesadelo para a saúde física.
Aí vem aquela pergunta de sempre dos mais céticos: cadê as evidências científicas disso?
Bem, pela lógica do teste de falseabilidade (Karl Popper, 1930), basta um cisne negro para provar que nem todos os cisnes são brancos. Para quem não acredita na toxicidade do silicone, basta uma mulher explantar o silicone e se curar dos sintomas prévios para provar que ele pode ser tóxico... e há varias delas na vida real.
Felizmente, algumas pesquisas já estão mostrando que mais de 50% das mulheres que viveram o pesadelo da síndrome ASIA melhoraram dos sintomas após o explante do silicone (Maijers e cols, 2013; Cohen e cols, 2017 e 2018). Elas finalmente estão podendo voltar a sonhar com uma saúde melhor.
Nosso papel é colocar luz no assunto para que mais mulheres estejam conscientes, reflitam bem antes de colocar as próteses e, caso já tenham colocado, identifiquem possíveis sintomas.
Para terminar... esse assunto parece feminino, mas os homens serão muito beneficiados se aprenderem isso para compreenderem e apoiarem melhor suas companheiras. Então, mães, não deixem de compartilhar com os homens que são importantes para vocês!
*Tanit Ganz Sanchez é otorrinolaringologista, Professora Livre-Docente e Associada da Faculdade de Medicina da USP, Fundadora e Diretora do Instituto Ganz Sanchez